terça-feira, 11 de outubro de 2016

LIVRO: 101 MARAVILHAS DE DEUS - VOLUME I

Livro que pode ser comprado no clubedeautores.com.br ou no amazon.com

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Livro de domínio público.

Sinopse

Apresento aos meus leitores mais um livro que fala das maravilhas de Deus na natureza. Observando os seres vivos e as leis da física, bem como os elementos químicos posso dizer com certeza que um ser Todo-Poderoso construiu este universo. A hipótese da teoria da evolução deve ser descartada e ridicularizada porque não há a menor probabilidade matemática de tanta perfeição existir por conta de eventos acidentais.
Categorias: CosmologiaCiências Da VidaCiência AmbientalTeologiaCiência 
Palavras-chave: biologia, criacionismo

Características

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Número de páginas: 107

Edição: 1(2016)

ISBN: 978-1539465133

Formato: A5 148x210

Acabamento: Brochura c/ orelha

Tipo de papel: Offset 75g





Jesus na visão Espírita

Jesus não era um espírito evoluido, a Bíblia o apresenta como Deus encarnado. O espiritismo não é uma religião bíblica, apenas usa porções da Bíblia.

Jesus na visão Espírita

Sergio Fernandes Aleixo
Em meio à crescente proliferação de doutrinas exóticas no seio mesmo do nosso movimento, sobremodo nos preocupam aquelas cujo resultado é a deturpação da legitima visão espírita de Jesus de Nazaré.
Ao contrário do que a negligência de muitos confrades pode supor, Allan Kardec deixou-nos bem definida a concepção espírita sobre a natureza do Cristo, quer física, quer, sobretudo, espiritualmente.
No comentário ao nº 226 de O Livro dos Espíritos, o codificador estabelece que, quanto ao estado no qual se encontram, os espíritos podem ser encarnados, errantes ou puros. Acerca dos puros, dizem os espíritos superiores: "Não são errantes... Esses se encontram no seu estado definitivo."
Tal é a condição espiritual de Jesus: a dos espíritos puros, ou seja, a dos espíritos que "percorreram todos os graus da escala e se despojaram de todas as impurezas da matéria" (Ob.cit.,nº 113). Apesar de integrar o número dos que "não estão mais sujeitos à reencarnação em corpos perecíveis", dos que "realizam a vida eterna no seio de Deus" (id. Ibid.), entre nós, por missão, o mestre encarnou-se. Conforme o nº 233 de O livro dos espíritos esclarece, "os espíritos já purificados descem aos mundos inferiores", a fim de que não estejam tais mundos "entregues a si mesmos, sem guias para dirigi-los".
É bem verdade que no comentário ao nº 625 da mencionada obra, Allan Kardec apresenta Jesus como "o tipo da perfeição moral a que a humanidade pode aspirar na Terra", em quase exata conformidade com o que diz sobre os espíritos superiores, os quais, segundo ele: "Quando, por exceção, encarnam na Terra, é para cumprir missão de progresso e então nos oferecem o tipo da perfeição a que a humanidade pode aspirar neste mundo" (nº 111).
Cumpre-nos salientar que na doutrina espírita o rigor do conceito de pureza se concentra na expressão "puro espírito", que Kardec explicou ser o estado dos seres que tradicionalmente são chamados "anjos, arcanjos ou serafins"; entretanto, com isso, não quis o codificador estabelecer a existência de gradações no estado de pureza espiritual; basta confrontarmos o item 111 com o item 226 de O livro dos espíritos.
Contudo, o sacrifício tipicamente missionário de um retorno à Terra, mesmo quando já não há necessidade desse tipo de experiência para evoluírem, é meritório aos espíritos superiores, do ponto de vista de sua progressão, pois não integram ainda a classe dos puros espíritos, não se encontram ainda no seu "estado definitivo".
Alguns entendem que este seria o caso de Jesus de Nazaré. Ele teria atingido a perfeição, ou, quiçá, um grau evolutivo mais alto entre os filhos do homem somente após o cumprimento de sua missão, o que, alias, é sugerido pelo autor da Epístola aos hebreus, o qual entende que Jesus, por seus sacrifícios, teria passado, de `sacerdote', à condição de `sumo sacerdote' da ordem de Melquisedeque.
Não desposamos essa idéia, embora admitamos que não confronta com o ensino de O livro dos espíritos, no qual, de fato, Jesus figura ainda como espírito superior; passível seria ele, portanto, de aperfeiçoamento.
A codificação espírita, todavia, não termina em O livro dos espíritos, começa nele. Allan Kardec desenvolveu e aprimorou o conceito espírita sobre a condição espiritual de Jesus como fez com relação a outros temas. Se não, vejamos.
Já mesmo em O livro dos médiuns, obra que constitui, segundo o próprio codificador, a seqüência de O livro dos espíritos, Allan Kardec passou a classificar Jesus como espírito puro. Na nota que escreve à dissertação IX do cap. XXXI, distingue, com absoluta clareza "os espíritos verdadeiramente superiores" daquele que representa "o espírito puro por excelência", por desvelada menção a Jesus Cristo.
Ora, Allan Kardec diz que tais espíritos, mesmo superiores, não têm as qualidades do Cristo; de novo estabelece, portanto, diferença entre Jesus e os espíritos superiores, como fez em O livro dos médiuns, na aludida nota à dissertação IX do cap. XXXI. Isso tão- só porque os espíritos superiores ainda não são puros.
Do livro: "Reencarnação – Lei da Bíblia, Lei do Evangelho, Lei de Deus." - Sergio Fernandes Aleixo, ed. Lachâtre

sábado, 9 de julho de 2016

WILLLIAN LANE CRAIG

A Minha Proposta de Cristologia Nega a Humanidade de Cristo?

Querido Dr. Craig,
Minha pergunta é em relação ao seu modelo de encarnação, especialmente a parte
Apolinária dele. As três bases da sua posição são: 1) Cristo tinha uma natureza distintamente divina e humana; 2) Que a alma de Jesus é o Logos, a Segunda Pessoa da Trindade; 3) Que durante Sua vida terrestre, Cristo teve uma consciência humana comum. O problema que eu vejo com esse modelo é que ao afirmar que algum componente da natureza humana de Jesus era o Logos, você na realidade enfraquece a afirmação de que Ele era verdadeiramente humano.
Uma faceta de ser humano é que nós somos capazes de experimentar a Deus diretamente. Nós somos capazes de nos engajar com a Trindade como um objeto de percepção, onde Deus se apresenta a nossa auto-consciência para conceder graça e revelação. Nós recebemos um presente, por meio do qual podemos participar nos relacionamentos e no amor da Trindade, onde Deus, um agente externo à nós, chega até nós. Ser distinto de Deus, como é mandatório da criação, é um aspecto significativo da natureza humana, e assim molda a natureza dos relacionamentos humanos e das experiências com Deus.
O desafio primário que seu modelo enfrenta é que ele significa que Jesus é incapaz de perceber a Palavra Criativa de Deus como um objeto, o que é fundamental para a natureza humana. Sendo o Logos, Ele só pode engajar com o Filho de Deus como um sujeito. Isso dissolve Sua humanidade para nada, pois para ser humano alguém deve ser capaz de se relacionar com Deus como um objeto externo, por sermos parte de uma ordem criada e distinta. Porém, Jesus pareceu experimentar Deus como um objeto através da oração e da fé. A consequência da sua teoria é que se a mente da Segunda Pessoa da Trindade estava em um corpo humano tendo uma experiência humana, Jesus não é verdadeiramente humano, pois Ele não pode distinguir-se da realidade divina, e, subsequentemente, pode apenas experimentar Deus como um sujeito.
Além do mais, se a natureza humana de Cristo depende da mente divina trabalhando em uma capacidade humana limitada, o que acontece após Seus dias carnais na terra? Se a mente divina só poderia funcionar com capacidade divina ou humana, mas não com ambas simultaneamente, então deve-se concluir que a distinta natureza humana de Cristo foi dispensada na ascensão para afirmar a prioridade da natureza divina de Cristo ao habitar à direita de Deus o Pai. Porém, esse entendimento não permite espaço para a tradicional doutrina católica da permanência da humanidade de Jesus. Se Jesus era verdadeiramente Deus e homem, então a permanência da humanidade com o Logos não poderia ser meramente temporal, pois faz parte da natureza humana ser ressuscitado, como Cristo. Portanto, sua teoria nos leva à conclusão radical de que o Filho de Deus livrou-se de Sua natureza humana após Sua vida terrestre, o que contradiz a doutrina tradicional de que Cristo continua a ter uma natureza divina e humana.
Minha pergunta então, Dr. Craig, é: como você responderia aos desafios apresentados contra seu modelo da Encarnação?
Deus abençoe,
Nathan.
Grã-Bretanha
- country not specified
Estas são boas perguntas, Nathan! Eu responderia, primeiro, alegando “Inocente!” e, segundo, acusando a posição que você parece defender como sendo implicitamente Nestoriana e, portanto, herética.
Minha alegação de “Inocente” será mais fácil de ser defendida se eu primeiro explicar minhas preocupações sobre sua posição. A ortodoxia requer que, enquanto Cristo tem duas naturezas completas, a humana e a divina, existe apenas uma pessoa em Cristo; e esta pessoa, sendo a segunda pessoa da Trindade, é divina. Assim, não existe a pessoa humana Jesus de Nazaré. Existe uma única pessoa que é Cristo, e essa pessoa é divina. Jesus é a segunda pessoa da Trindade encarnada. Dizer que existe, além desta pessoa, outra pessoa que é humana é Nestoranismo, que erra ao dividir a pessoa de Cristo em duas pessoas, uma humana e outra divina.
Então quando você discorda que na minha visão “Jesus não é verdadeiramente humano, pois Ele não pode distinguir-se da realidade divina,” e “Jesus é incapaz de perceber a Palavra Criativa de Deus como um objeto...Sendo o Logos, Ele só pode engajar-se com o Filho de Deus como um sujeito,” sua visão é implicitamente Nestoriana. A palavra “Ele” é um pronome pessoal referindo-se à pessoa chamada “Jesus”. Você está dizendo que aquela pessoa é distinta da realidade divina e da Palavra. Isto é Nestoriano. A ortodoxia requer que Jesus seja idêntico à Palavra, a
divina segunda pessoa da Trindade.
Isso implica que na ortodoxia Jesus não pode compreender-se como um objeto? Não, pois cada um de nós compreende-se como um objeto quando pensamos em nós mesmos. Então nós usamos a apalavra “mim” em vez de “eu.” Quando falamos como sujeitos usamos “eu,” mas quando falamos de nós mesmos como objetos usamos a palavra “mim.” Obviamente, Jesus como objeto ou um sujeito permanece divino, pois só existe uma pessoa que é Cristo, e aquela pessoa é divina. O que Jesus não pode fazer é compreender-se como distinto da Palavra porque Ele é a Palavra!
Eu acho que esse modo de entender me absolve da acusação de negar a humanidade de Cristo. Tudo o que eu nego é que existe uma pessoa humana distinta da segunda pessoa da Trindade. Isso é exatamente o que a ortodoxia cristã afirma. Mas eu afirmo que existe um composto corpo/alma que é a natureza humana individual de Cristo. Minha posição tem uma vantagem em relação à visão tradicional porque torna claro o motivo pelo qual este composto corpo/alma não é, ao contrário do que se esperaria, uma pessoa humana.
Eu concordo com você que “Jesus parecia experimentar Deus como um objeto, através de oração e da fé.”. Mas “Deus” nessa frase refere-se a Deus o Pai. Foi para Deus, o Pai, que Jesus orava (Ele não estava falando consigo mesmo!) e em Deus, o Pai, que Jesus confiava.
E Jesus em Seu estado glorificado? Eu afirmo que Jesus foi ressurreto corporalmente da morte e portanto mantém Sua natureza humana para a eternidade. A questão se todo Seu intelecto divino vem à consciência no estado glorificado não é contemplada no modelo que eu proponho. Se sim ou não, Jesus é e sempre foi onisciente. Isso mostra que enquantoverdadeiramente humano (i.e., tinha uma natureza humana), Ele não era meramente humano.
O modelo também não contempla a pergunta de se a mente do Logos mesmo no estado encarnado de humilhação não era simultaneamente consciente fora da carne. Tom Morris no seu livro The Logic of God Incarnate (A Lógica do Deus Encarnado) oferece algumas analogias interessantes sobre isso. Estou aberto à essa possibilidade, mas não comprometido com ela. O importante é que ser não-onisciente não é uma propriedade essencial da humanidade.
Portanto, parece-me que minha proposta de Cristologia permanece ortodoxa.
William Lane Craig


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LIVRO: BALEIAS - MARAVILHAS DE DEUS

Livro cristão que fala sobre as baleias sob o prisma da criação divina. Os detalhes da anatomia e fisiologia das baleias mostram que elas são maravilhas de Deus.

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clubedeautores ou no  amazon.com



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Número de páginas: 168

Edição: 1(2016)

ISBN: 978-1535155687

Formato: A5 148x210

Acabamento: Brochura c/ orelha

Tipo de papel: Offset 75g



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segunda-feira, 9 de maio de 2016

O MISTICISMO DA CRISTOLOGIA DÊUTERO-PAULINAS

O MISTICISMO DA CRISTOLOGIA CÓSMICA DAS DÊUTERO-PAULINAS Rogério Lima Moura * Francisco Benedito Leite ** Resumo Com esse texto pretendemos, em primeiro lugar, apresentar o misticismo da cristologia cósmica das cartas dêutero-paulinas como uma espécie de experiência mística autêntica - não apenas uma característica literária sem relação com a vida e as sensações religiosas fruídas pelos cristãos do fim do século I. Em segundo lugar, pretendemos apresentar as características angelomórficas de Cristo expostas nessas cartas, e por último, apresentaremos o dualismo gnóstico-judaico na cristologia das dêutero-paulinas. Palavras-chave: Misticismo; Cristologia cósmica; Dêutero-paulinas; Apocalíptica; Mercabá. Abstract With this text we seek, in the first place, introduce the mysticism of cosmic Christology of the Deutero-Pauline letters as a kind of authentic mystical experience – not just a literary character with no relation to religious life and the feelings experienced by Christians in the late first century. Secondly, we intend to present the angelomorphic characteristics of Christ exposed in these letters, and finally present the Jewish-Gnostic dualism of the Deutero-Pauline Christology. Keywords: Mysticism; Cosmic Christology; Deutero-Pauline; Apocalyptic; Mercaba. ORACULA 8.13 (2012) ISSN: 1807-8222 Oracula 8.13 (2012) 26 Introdução Por dêutero-paulinas, intitulamos duas cartas tradicionalmente atribuídas ao apóstolo Paulo, mas, que desde o desenvolvimento do método histórico-crítico, no século XIX, vêm tendo sua autenticidade questionada, tanto devido a discrepâncias teológicas, quanto devido a diferenças em linguagem e estilo. Aqui serão apresentadas apenas as discrepâncias teológicas no que diz respeito à cristologia, em relação às outras cartas paulinas tidas como autênticas1. Embora o intuito não seja apontar, nessas cartas, os pontos contraditórios à teologia paulina, como fizeram os adeptos do método histórico-crítico de outrora, pois utilizamos o termo “dêutero-paulinas” provisoriamente, ainda que com ele se pretenda uma definição de outro estágio da teologia paulina. Contudo o texto que segue não pretende uma discussão quanto à autoria, mas sim, quanto à cristologia exposta nas duas cartas, definidas como tais, a saber: Colossenses e Efésios. No que diz respeito à “cristologia cósmica”, esse termo não está exclusivamente preso aos limites do que estamos chamando provisoriamente de dêutero-paulinismo, pois, suas raízes estão presas na própria teologia paulina, ou talvez, sejam ainda mais profundas. Além disso, essa teologia chega a ir além da literatura neotestamentária, pois de uma forma ou de outra, a teologia patrística e medieval incorporaram essa ideia à Igreja oficial, porém foge ao nosso propósito apontar esses desenvolvimentos. Outrossim, a cristologia cósmica é a ideia de que Jesus, após a ressurreição, foi declarado Cristo, soberano sobre tudo e sobre todos, e seus favores ultrapassaram a salvação dos homens e chegaram a ter uma relação com o kosmos. Esse é um esclarecimento bastante breve e estereotipado, uma vez que é apenas uma preliminar do que será descrito de maneira mais detalhada abaixo. * Bacharel em Teologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mestrando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, membro do Grupo Oracula de Pesquisa em apocalíptica, misticismo e fenômenos visionários. E-mail: rogerlima1@yahoo.com.br. **Bacharel em Teologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mestrando em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, membro do Grupo Oracula de Pesquisa em apocalíptica, misticismo e fenômenos visionários. E-mail: ethnosfran@hotmail.com. Oracula 8.13 (2012) 27 Misticismo e cristologia cósmica, em Paulo e nas dêutero-paulinas Continuando com uma breve definição de termos, agora esclareçamos mais detidamente os termos “misticismo” e “cristologia cósmica”, um de cada vez. Para definir misticismo utilizemo-nos de um clássico no que diz respeito ao misticismo judaico, a obra: As grandes correntes da mística judaica, de Gershom Scholem. Esse estudioso do judaísmo fala o seguinte a respeito da “religião mística”: Vou usar a palavra para designar o tipo de religião que coloca ênfase na percepção imediata da relação com Deus, na consciência íntima e direta da Presença Divina. É a religião em seu estágio mais vivo, agudo e intenso. Tomás de Aquino define o misticismo como cognitio dei experimentalis, o conhecimento de Deus pela experiência. Ao usar esse termo, ele se apóia fortemente, como muitos místicos antes e depois dele, nas palavras do salmista (Salmo 34.8): “Provai e vede que o Senhor é bom”. É este provar e ver, não importa o quão espiritualizado ele venha a tornar-se, que o místico genuíno deseja. Sua atitude é determinada pela experiência fundamental do eu íntimo que entra em contato imediato com Deus ou com a realidade metafísica. O que forma a essência dessa experiência, e como ela pode ser adequadamente descrita – é este o grande enigma que os próprios místicos, não menos que os historiadores, têm tentado resolver. 2 Com essas palavras, Scholem apenas delineia o misticismo, e propositalmente prefere uma definição não restritiva. Ao longo de suas palestras que se tornaram o livro: Grandes correntes da mística judaica, por várias vezes ele responderá novamente, e com novas proposições, à pergunta “o que é mística?” Por enquanto as linhas citadas acima parecem suficientes. Contudo, parece-nos igualmente importante também responder: “o que não é misticismo”, na perspectiva de Scholem. E nesse caso ele é enfático ao afirmar a diferença entre a unio mystica e a mística do judaísmo3. Pois a unio mystica não deve ser considerada o misticismo autêntico em detrimento de outras espécies de misticismos como o da Mercabá4, no qual não há nenhum vestígio da união da alma 1A saber: Romanos, I e II Corintios, Gálatas, Filipenses, I Tessalonicenses e Filemon. Contudo, muitas discussões acadêmicas tiram ou colocam uma ou outra carta dentre as autênticas. 2 SCHOLEM, Gershom. As grandes correntes místicas da judaica. 3 ed. São Paulo: Perspectiva, 2008, p. 6, onde o autor utiliza a definição de Rufus Jones em Studies in Mystical Religion. London, 1909, p. XV. 3 SCHOLEM, As grandes correntes místicas da judaica, p. 7. 4 Trataremos mais detidamente da Merkabá a baixo, por enquanto diremos apenas que este foi o nome que recebeu a ramificação mística do judaísmo caracterizada por ascensões visionarias ao Oracula 8.13 (2012) 28 com Deus5, pois, definitivamente, no misticismo do qual ele tratará, não existe a união entre criatura e criador. Resumindo, a mística que falamos é a fase, ou área mais viva da religiosidade, é a experimentação prática e imediata com Deus, mas não é determinantemente – para o judaísmo e cristianismo primitivo – “o diluir-se na divindade”. Visto que para Scholem não existe mística autônoma, toda espécie de mística está relacionada a um sistema religioso, portanto, relaciona-se com suas premissas primarias, e, outrossim, os místicos não devem ser vistos, necessariamente, como heréticos ou rebeldes, pois a grande maioria dos místicos esteve entre os ortodoxos6. Para definir cristologia cósmica contamos com algumas palavras do célebre estudioso das religiões, Mircea Eliade, em seu livro Mito e realidade. Ao descrever o desenvolvimento do cristianismo cósmico, o historiador assim apresenta esse processo: As igrejas Ortodoxa e Católica Romana foram criticadas por aceitarem tão grande número de elementos pagãos. Seriam essas críticas sempre justificadas? Por um lado, o ‘paganismo’, só pôde sobreviver cristianizado, embora essa cristianização fosse apenas superficial. Essa política de assimilar um ‘paganismo’ ao qual era impossível destruir, não construiu inovação; a Igreja Primitiva já aceitara e assimilara grande parte do calendário sagrado pré-cristão. Por outro lado, os camponeses, devido ao seu próprio modo de existir no Cosmo, não se sentiam atraídos por um cristianismo ‘histórico’ e moral. A experiência religiosa especifica das populações rurais era nutrida pelo que se poderia chamar de um ‘cristianismo cósmico’. Os camponeses da Europa compreendiam o cristianismo como uma liturgia cósmica. O mistério cristológico envolvia igualmente o destino do Cosmo. ‘Toda natureza suspira, aguardando a ressurreição’, é o motivo central não só da liturgia pascal, mas também do folclore religioso da cristandade oriental. A solidariedade mística com os ritmos cósmicos, violentamente atacada pelos profetas do Antigo Testamento e apenas tolerada pela Igreja, constitui o centro da vida religiosa das populações rurais, sobretudo no sudeste da Europa. Para toda essa parte da cristandade, a ‘Natureza’ não é o mundo do pecado, mas a obra de Deus. Após a Encarnação, o mundo foi restabelecido em sua glória original; essa maneira pela qual Cristo e a Igreja foram carregados de tantos símbolos cósmicos. No folclore religioso do Sudeste europeu, santificam igualmente a Natureza. 7 céu, que tem com seu primeiro representante conhecido o profeta Ezequiel, que viu Deus sentado em um trono carruagem, daí o nome Merkabá. 5 SCHOLEM, As grandes correntes místicas da judaica, p. 61 6 SCHOLEM, As grandes correntes místicas da judaica, p. 8. 7 ELIADE, Mircea. Mito e realidade. 6 ed. São Paulo: Perspectiva, 2006 (Coleção Debates), p. 150. Oracula 8.13 (2012) 29 Concordando com essas duas citações, afirmamos que tanto a definição de mística apresentada por Scholem quanto à descrição do desenvolvimento do cristianismo cósmico de Eliade, estão presentes na teologia paulina das cartas tidas como autênticas, pois, Jonas Machado8 – na esteira de outros estudiosos, como John Ashton, Christopher Rowland e John Collins - apresenta os seguintes elementos como paradigmas da religião paulina: “ascensão visionária celestial em êxtase, possessão espiritual e revelação de mistérios da divindade numa relação criativa”, o que leva à conclusão de sua clara relação com a apocalíptica e o misticismo judaico. Essa perspectiva, de relacionar Paulo e a apocalíptica judaica, tem tido uma repercussão positiva no meio acadêmico e tem ganhado adeptos dentre os bíblistas e estudiosos do misticismo, visto que o próprio Scholem inserira o apóstolo na tradição da Mercabá. Contudo, para Paulo – ou para o dêutero-Paulo – o último mistério divino não é a ascensão celestial, mesmo ela sendo um importante componente no plano da salvação divina, isso é o que afirma Christopher Morray-Jones e Christopher Rowland em The mystery of God9. Os versículos que seguem são demonstrativos de que Paulo afirmava que a obra de Cristo envolvia, não somente a vida individual dos seres humanos, mas todo o kosmos, os seres humanos em sua conjuntura e também a natureza. Em Romanos 8.22 está escrito: “Porque sabemos que toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora”; e em: I Coríntios 15.27: “Porque todas as coisas sujeitou debaixo de seus pés. Mas, quando diz que todas as coisas lhe estão sujeitas, claro está que se excetua aquele que lhe sujeitou todas as coisas”; Filipenses 2.9,10: “Por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome. Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra”. Assim, Jesus é apresentado em uma posição superior a tudo e a todos, uma posição de tensão que envolve expectativas escatológicas prementes. 8 MACHADO, Jonas. Paulo, o visionário: visões e revelações extáticas como paradigma da religião paulina. In: NOGUEIRA Paulo A. S. (Org.). Religião de visionários: apocalíptica e misticismo no cristianismo primitivo. São Paulo: Loyola, 2005 (Coleção Bíblica Loyola, 48), p. 167-204. 9 ROWLAND, Christopher; MORRAY-JONES, Christopher R. A. The Mystery of God. Early Jewish Mysticism and the New Testament. Leiden: Brill, 2009, p. 156-166. Oracula 8.13 (2012) 30 Dos parágrafos precedentes surge o questionamento óbvio: já que se acredita que Paulo é tanto místico quanto proponente da cristologia cósmica, mesmo tendo com base apenas as cartas autênticas, o que há de especial ou diferente no misticismo da cristologia cósmica das dêutero-paulinas? A diferença é que as dêutero-paulinas levam as afirmativas cósmicocristológicas a um grau mais elevado e enfático. E o misticismo das dêuteropaulinas já não é mais o mesmo misticismo apocalíptico e escatológico que o apóstolo Paulo professara nas cartas tidas como autênticas. Essa diferença de ênfase foi significativa, devido a sua importância em vista das questões institucionais, pois, o misticismo apocalíptico de outrora foi canalizado pela instituição em desenvolvimento e assim pode ser - em grau mais ou menos elevado – racionalizado, para ser compreendido e acessível ao grande público e ao mesmo tempo, não ser contraditório a uma instituição que se pretendia universal. Temos a possibilidade de afirmar a institucionalização dessa comunidade cristã e a canalização do misticismo na carta aos Efésios, devido a uma de suas “características definitivas” - conforme Christopher Rowland e Christopher R. A. Morray-Jones - ser “o seu sabor fortemente litúrgico”10. Já foi afirmada a possibilidade de que essa carta fosse um tratado batismal. E sua estreita relação com a carta aos Colossenses abre a possibilidade de que as duas cartas estejam relacionadas com comunidades que estejam em um estágio de institucionalização semelhante. Nos parágrafos que seguem, tentaremos demonstrar esse processo através de termos dos textos de Efésios e Colossenses em relação às sete cartas tidas como autênticas. Primeiramente, tomaremos a teologia expressa na metáfora do corpo de Cristo. Cristo e o kosmos - “Cristo é a cabeça do corpo que é a Igreja” Em I Co 12 o apóstolo Paulo ensina a respeito “dos espirituais”, pois em 12.1 não está escrita a palavra charisma, embora praticamente todas as traduções 10 ROWLAND, Christopher; MORRAY-JONES, Christopher R. A. The Mystery of God. Early Jewish Mysticism and the New Testament. Leiden: Brill, 2009, p. 585. Oracula 8.13 (2012) 31 da Bíblia para o português tenham preferido inseri-la, com a concepção de que ela deveria ser subentendida, visto que o texto a partir do versículo 4 repetirá várias vezes a palavra charisma. Conforme Jonas Machado, nesse trecho, Paulo fala a respeito das coisas, manifestações ou pessoas espirituais no âmbito do culto11. Assim, o trecho 12.13-27, Paulo utiliza-se da metáfora do corpo, aplicando-a exclusivamente para a comunidade local, fazendo com que seja incoerente a tentativa de extrair alguma pretensão universalizante do texto, pois todos os charismas são úteis para a comunidade local. Outra coisa a ser destacada nesse trecho é que, em 12.27, Paulo afirma “vós sois o corpo de Cristo e seus membros em particular”, mas, Paulo não está dizendo que vós sois o corpo de Cristo, que é a cabeça. Pois, nessa metáfora não há hierarquia entre cabeça e corpo, conforme fica claro no versículo 21, a própria cabeça está envolvida na discussão que afirma a igualdade de todos os membros. Portanto, “vós sois o corpo de Cristo” significa que a comunidade (local) e Cristo são o mesmo, pois os crentes foram inseridos em Cristo através do “batismo no espírito” (12.13). Em Rm 12.4-5 aparece um resumo do que está escrito em I Co 12: Porque assim como em um corpo temos muitos membros, e nem todos os membros têm a mesma operação. Assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos outros. O fato de os crentes gozarem de uma mesma corporeidade uns com os outros e também com Cristo é simbolizado pela divisão do pão, durante a ceia do Senhor, mas essa mística da corporeidade parece não ir além da comunidade local, e ainda parece ser pouco definido e delimitado, o que permitiria uma ampla gama de interpretações, longe de qualquer espécie de sistematização, devido a seu caráter eventual. Essa relação, entre os crentes que estão inseridos em Cristo e são o corpo de Cristo, foi explorada por Albert Schweitzer em O misticismo de Paulo, o 11 MACHADO, Jonas. O misticismo apocalíptico do apóstolo Paulo: Um novo olhar nas Cartas aos Coríntios na perspectiva da experiência religiosa. São Paulo: Paulus, 2009, p. 187s. Oracula 8.13 (2012) 32 apóstolo, e assim, o teólogo alemão afirmou que a teologia do corpo de Cristo em Efésios é uma evidência contra a autoria paulina, pois sempre que Paulo fala do corpo de Cristo, ele se refere à Igreja como uma totalidade12, uma instituição universal. É certo que Schweitzer tem pouco crédito para a pesquisa contemporânea sobre o apóstolo Paulo, visto que ele compreendia o apóstolo Paulo como um pensador lógico13 e o misticismo do qual fala, não passa de um elemento teológico que não tem base na experiência, como fica claro ao longo de sua obra. Entretanto, no que diz respeito à evolução da teologia paulina do corpo de Cristo, parece estar correto acerca das enormes diferenças entre a teologia de Efésios (e queremos acrescentar paralelamente Colossenses) e as demais cartas tidas como autênticas. Conforme Morray-Jones e Rowland, a metáfora do corpo, nas cartas que circulavam na Ásia Menor, deve estar relacionada com um texto midráxico que faz parte da literatura de hehalot, chamado Schiur Komá [A medida do Corpo – corpo de Deus]. Conforme esse escrito, o corpo de Deus possui medidas descomunais semelhantemente à “medida do amor de Deus” em Efésios 3.18. Essas comunidades cristãs parecem ter reinterpretado esse escrito para fazer uso dele a sua própria maneira. O corpo de Cristo em Efésios aparece pelo menos sete vezes (1.23, 2.16, 3.6, 4.4, 4.16, 5.23, 5.30), das quais, três vezes está relacionado com a cabeça, que é Cristo, que aparece separadamente (1.22, 4.15, 5.23). Em Colossenses aparece pelo menos quatro vezes (1.18, 1.24, 2.19, 3.15) e em duas vezes está relacionado com a cabeça (1.18 e 2.19), que aparece também em 2.10. Cristo, parece ter sido elevado a uma posição superior à que ele possuía em outros escritos neotestamentários, de maneira que ele já efetuou toda a expectativa dos cristãos primitivos, então ele deixa de dividir a mesma corporeidade que os crentes e passa a ser a cabeça do corpo que eles compartilham como Igreja, se sobrepondo aos fiéis, num estado superior a tudo e a todos. 12 SCHWEITZER, Albert. Misticismo de Paulo: o apóstolo. São Paulo: Fonte Editorial, 2006, p. 166. 13 SCHWEITZER, Misticismo de Paulo: o apóstolo, p. 188. Oracula 8.13 (2012) 33 I Co 15.24-28 e Fp 2.10 apresentam expectativas escatológicas do momento em que tudo será sujeito a Cristo e a vitória sobre os poderes será efetuada por completo. Mas, em Efésios tudo isso parece já ter se cumprido, pois “nele congregam todas as coisas” (1.10), “ele está acima de todo principado e poder” (1.21) “à direita de Deus” (1.20) e de maneira particularmente interessante, “ele levou cativo o cativeiro” (4.8-10). De maneira semelhante, em Colossenses “tudo converge em Cristo”; “ele é a imagem do Deus invisível, primogênito de toda criação” (1.15); “nele habita toda plenitude” (2.19); “ele triunfou sobre as potestades” (2.15); e “está à destra de Deus” (3.1). Nessas duas cartas, também, há uma forte ênfase na apolytrôsis através do sangue de Cristo (Cl 1.14; Ef 1.7, passim). “Pois Cristo cravou a cédula de nossa dívida na cruz” (Cl 2.14). Somando essas citações com o trecho extraído do texto de Eliade14, podemos compreender que para determinados grupos de cristãos, a apresentação de um Jesus histórico, inserido em narrativas de sua vida na Palestina – como os evangelhos – e a expectativa de sua vinda como Filho do Homem, manifestando sua glória e poder, não era mais suficiente, pois este passado estava ficando historicamente distante e sua vinda estava tardando. Então seria necessário que Cristo passasse a fazer parte do cotidiano de suas vidas, contudo, para isso algumas mudanças seriam inevitáveis, tanto na teoria, quanto na prática. Assim, uma das consequências práticas foi que a comunidade local deixou de ser o corpo de Cristo, como o era em I Co 12.27, e Cristo passou a estar superior a tudo e todos, em uma posição elevadíssima, que embora envolvesse todo o cosmo, parecia cada vez mais se distanciar das comunidades locais, pois os elementos repetidos várias vezes eram os “poderes e principados”. E os charismas não eram mais manifestações espirituais da comunidade local, eles passaram a ser ofícios padronizados para todas as comunidades (Ef 4.11-12). De maneira que Cristo estava envolvido na manutenção do kosmos, mas não nos seus pormenores. Todavia, esse distanciamento entre Cristo e comunidade não parece ter sido um 14 ELIADE, Mito e realidade, p. 150. Oracula 8.13 (2012) 34 problema insolúvel, e o dualismo, foi pacificamente aceito e reinterpretado, pois, a partir de então, os crentes sentiam que compartilhavam desde já, parte dos favores, que no paulinismo tido como autêntico, era uma obra escatológica. Pois ele “vos arrancou das trevas e transportou ao reino do seu filho amado”. Então os favores oferecidos pelo Cristo: “benção da parte de Deus, eleição, predestinação, herança” (Ef 1.3-5) foram imputados no crente através de um processo de morte e ressurreição, que em sua vida revive os eventos da vida de Cristo, mas que na verdade eram realizações litúrgicas. “Ascensão visionária celestial em êxtase, possessão espiritual e revelação de mistérios da divindade numa relação criativa” não são características nesses escritos, pois a mística é institucional, não há indícios de uma fruição individual de manifestações espirituais, tudo é intermediado pela igreja, os dons/ofícios, o estar em Cristo e as bênçãos futuras. Scholem afirma que o misticismo da Mercabá, em alguns casos, degenera em interpretação moral15, por isso as afirmativas cristológicas embasam o moralismo pregado nessas cartas (Ef 4.17-5.21; Cl 3; passim). “O cristianismo primitivo foi um fenômeno apocalíptico-escatológico. E o cristianismo nunca teria sido uma religião mundial se não tivesse nascido junto com a apocalíptica judaica”16 “... todas as energias produtivas do primitivo movimento apocalíptico foram absorvidas pelo cristianismo após o surgimento deste”17. Apesar da veracidade dessas afirmativas, as cartas dêutero-paulinas são estigmas do processo que o cristianismo primitivo passaria, onde todas as energias místicas da antiga apocalíptica seriam canalizados pela recente instituição cristã, que agora descrevia o Cristo em seus próprios moldes, pois segundo essas cartas, o mistério já foi abertamente revelado aos cristãos Como me foi este mistério manifestado pela revelação, como antes um pouco vos escrevi. Por isso, quando ledes, podeis perceber a minha compreensão do mistério de Cristo. O qual noutros séculos não foi manifestado aos filhos dos homens, como agora tem sido revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas. A saber, que os gentios são 15 SCHOLEM, As grandes correntes místicas da judaica, p. 86. 16 OTZEN, Benedikt. O judaísmo na antiguidade: a história política e as correntes religiosas de Alexandre Magno até o imperador Adriano. São Paulo: Paulinas, 2003, p. 288. 17 SCHOLEM, As grandes correntes místicas da judaica, p. 45. Oracula 8.13 (2012) 35 co-herdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho (Ef 3.3-6). 18 Porém, não se deve ter uma postura tão crítica diante desse fenômeno religioso tradicional, como fizeram teólogos do passado que cultivaram certa decepção com o cristianismo da terceira geração, em vista de seu esfriamento19. Paul Tillich afirma que esse período de esfriamento faz parte de um processo pedagógico, “são necessidades educacionais que entram em cena para preservar o que foi dado antes”20. Bem que podemos apresentar essa amenização de ânimos da terceira geração de cristãos em outros termos. O pensador russo Mikhail Bakhtin afirma o seguinte: É preciso não perder de vista o papel enorme que desempenha o medo cósmico – medo de tudo que é imensuravelmente grande e forte; firmamento, massas montanhosas, mar – medo das perturbações cósmicas e das calamidades naturais, nas mais antigas mitologias, concepções e sistemas de imagens, e até nas próprias línguas e formas de pensamento que elas determinam. Uma certa lembrança das perturbações cósmicas passadas, um certo temor indefinível dos abalos cósmicos futuros dissimulam-se no próprio fundamento do pensamento e da imagem humanos. Na base esse temor, que não é absolutamente místico, no sentido próprio do termo (é o temor inspirado pelas coisas materiais de grande porte e pela força material invencível) é utilizado por todos sistemas religiosos com o fim de oprimir o homem de dominar sua consciência. 21 Nessa citação, Bakhtin descreve uma espécie de medo cósmico inerente ao ser humano que é apropriado pelos sistemas religiosos, assim, afirma que essa não é uma espécie de medo estritamente místico, pois se relaciona com elementos materiais, contudo, segundo Bakhtin uma das soluções encontradas para superação desse medo é a associação do si mesmo com o grupo religioso no qual está inserido, e, por sua vez do grupo no kosmos, pois as afirmações que remetem a 18 Cf. Cl 1.26-27; Ef 1.9. Reinterpretando as experiências apocalípticas, através de seu misticismo altamente litúrgico. 19 Característica sintomática da teologia alemã do século XX, manifesta claramente na Teologia do Novo Testamento de Rudolf Bultmann que apresenta, no terceiro capítulo, a decadência do cristianismo instituído em vista do auge alcançado por Paulo e João. A Teologia da Libertação também compartilhou essa idéia, nas palavras do teólogo Eduardo Hoornaert: “o vulcão evangélico nela [na literatura da terceira geração de cristãos] teria apenas deixado algumas faíscas inofensivas, até apagar-se por inteiro” (Cristãos da terceira geração. Petrópolis/São Paulo: Vozes/Cehila, 1997, p. 33.) 20 TILLICH, Paul. História do pensamento cristão. 3 ed. São Paulo: ASTE, 2004, p. 38. 21 BAKHTIN, Mikhail. Cultura popular na idade média e no renascimento: o contexto de François Rabelais. São Paulo: Hucitec, 2010, p. 293. Oracula 8.13 (2012) 36 esperança futura e às realidades abstratas não são mais suficientes, o ser humano necessita de princípios concretos para refugiar-se de seu medo. Nas palavras de Bakhtin, assim se dá esse processo: Essa luta contra o temor cósmico, em todas suas formas e manifestações, apoiava-se não sobre esperanças abstratas, sobre a eternidade do espírito, mas sobre o princípio material, incluído no próprio homem. De alguma forma, o homem assimilava os elementos cósmicos (terra, água, ar, fogo), encontrando-os e experimentado-os no seu próprio interior, no seu próprio corpo; ele sentia o cosmo em si mesmo. 22 Assim podemos interpretar a experiência religiosa das comunidades cristãs nessa perspectiva. Pois, enquanto que as primeiras gerações de cristãos tiveram seus medos e suas perturbações amenizadas pela crença na iminente vinda de Cristo que se manifestava através dos charismata durante o culto, a terceira geração, no entanto, não permaneceu com a crença nessa vinda iminente tão forte, tão pouco os charismata estavam tão efervescentes. Então, uma solução natural diante desse acalmamento de ânimos foi encontrar um lugar no kosmos para Cristo, na verdade, associá-lo ao kosmos, pois, ao associá-lo a algo material, se tornaria possível gozar materialmente de suas bênçãos através das chuvas, da colheita e assim por diante. As dêutero-paulinas são o passo determinante desse processo, que não começou, tampouco acabou nelas, contudo, são o par de escritos onde podemos notar claramente esse processo em vista de seu precedente e de sua posteridade. Pois, é ali que o Cristo se sobrepõe enfaticamente aos “principados e potestades”. Muitas interpretações que não levaram em conta a literatura contemporânea ao período da carta, afirmou que esses termos se referiam aos seres espirituais malignos, semelhantes ao príncipe da Pérsia de Daniel 10.13, ou interpretações sociológicas redutivistas associaram esse par de termos aos poderes políticos, porém, parece muito mais satisfatório afirmar que esses principados e potestades eram os seres celestiais que cuidavam do bom andamento do kosmos, tratando tanto de questões meteorológicas, quanto de questões astronômicas, como sugere I Enoc 72-82 – O livro dos luminares celestes –, onde Uriel foi posto por Deus sobre todos luminares celestes; e também II Enoc, onde no sexto céu, o visionário 22 BAKHTIN, Cultura popular na idade média e no renascimento, p. 294. Oracula 8.13 (2012) 37 conhece os anjos que comandam os astros, após ter conhecido os que comandam o clima e as estações. Ainda mais, levando em conta que ao longo das cartas paulinas, os termos que traduzimos por poderes celestes, ou, simplesmente poderes, sejam claramente hostis na concepção de Paulo (Rm 8.38-39; I Co 15.24). Essa relação com os livros de Enoc, ganha ênfase devido a possibilidade de que nas comunidades da Ásia Menor havia culto aos anjos, conforme afirmam Morray-Jones e Rowland23, que concordam com essa antiga afirmativa. Em Mystery of God: Early Jewish Mysticism and the New Testament, apresentam um contexto que contribui para que se chegue às conclusões acima. A seguir apresentaremos suas argumentações a respeito disso nos parágrafos que seguem abaixo. Contexto das epístolas de Colossenses e Efésios A respeito do contexto de Colossenses24, os autores afirmam que a presença de palavras como “lua nova” e “sábado” em 2.16, “circuncisão” em 2.11 e crenças em anjos 2.18, dá a entender que ali havia um forte judaísmo místico apocalíptico. Ainda acrescentam que a Ásia Menor foi um centro de apocalipsismo, como é atestado em Eusébio e Irineu. Nesses escritos, atesta-se que a heresia de Cerinto se localizava em Éfeso, onde se praticava revelações mediadas por anjos. A Frígia foi o lugar de origem do montanismo, que era um movimento que tinha um rigor ético aguçado e um entusiasmo escatológico ligado com visões e profecias, e que também há pontos de contatos entre a carta à Laodicéia em Apocalipse 3 e Colossenses. De acordo com Apocalipse 3. 21, existe esperança para aqueles que vencerem, e eles sentarão no trono de Cristo. Em Colossenses 1.16, os tronos provavelmente refletem de certa maneira uma cosmologia que se encontra no livro Ascensão de Isaias, em que são descritos cinco dos sete céus com tronos localizados neles. Também em Colossenses 3.1, o autor dirige o leitor “ao céu” para o acento de Cristo, da mesma forma que em Apocalipse 3.14, onde Cristo é descrito como “o 23 ROWLAND; MORRAY-JONES, The Mystery of God, p. 585ss. 24 ROWLAND; MORRAY-JONES, The Mystery of God, p. 156-166. Oracula 8.13 (2012) 38 princípio da criação de Deus”, uma descrição sem paralelo no livro de Apocalipse e única em que a linguagem da pré-existência aparece. A semelhança com Colossenses 1.15 é extraordinária, assim como a frase: “primogênito dentre os mortos” ocorre somente em 1.18 e Apocalipse 1.5. É possível que João, que parece ter íntimo conhecimento das igrejas, possa ter sido influenciado por ideias familiares das comunidades dessa área. Se essas ideias refletiram um judaísmo local, ou se é uma importante forma de judaísmo cristão a questão é incerta. A ligação de Cerinto com Éfeso e com essa particular forma de judaísmo cristão pode ser um argumento para supor que temos em Colossos mais uma evidência de uma forma de judaísmo cristão que teve sua origem na Palestina. Uma Passagem chave para ligar a epístola a elementos apocalípticos é Colossenses 2.16 e seguintes, quando entendemos o rigor ético do ensino de que Paulo combate, a ênfase nas restrições do que comer e beber ou a observância de certos festivais. A mesma preocupação aparece em 2.21, onde Paulo parece mencionar as instruções dos oponentes quando ele se refere ao controle de não tocar, provar ou experimentar. Tais restrições são bem importantes dentro de uma situação onde experiências visionárias foram também importantes. É-nos conhecido de apocalipses e de materiais tardios do misticismo judaico que apresentavam rígidas preparações, necessárias como pré-requisito para a recepção de visões. Colossenses 2.18 é crucial nesse aspecto, Paulo previne os colossenses sobre aqueles que tentam diferenciar entre crentes, aceitando alguns e desqualificando outros. A base para a desqualificação deles é a reverência, submissão e a adoração de anjos. Na literatura judaica há interesse em tal atividade de poderes angélicos. É possível supor que Colossenses 2.18 poderia ser uma referência para a atividade de anjos no céu, enquanto cinco versículos depois as mesmas palavras poderiam ser usadas para uma adoração humana? Pode-se responder que isto foi uma imitação do comportamento dos anjos que eles vêem em suas visões. Evidências dos manuscritos do Mar Morto sugerem uma ligação entre comunidade terrena e o céu. Como os anjos do céu têm seu lugar determinado na Oracula 8.13 (2012) 39 liturgia celestial (4Q 405 23i; cf. En 20.3ss.), é dada a comunidade terrena uma posição correspondente ao propósito eterno (1QS 2.22s; 5.23s; 6.8ss.). A prática dos membros da comunidade de Qumran é uma forma deles conquistarem um íntimo relacionamento com os anjos. Essas informações podem sugerir que os colossenses imaginaram que a imitação do comportamento angélico de adoração foi de forma geral apropriado e concedido à comunhão deles com eles em suas visões. Outra possibilidade é que a adoração de anjos se refere à reverência feita por anjos na presença do místico privilegiado. Isto é pensado em algumas fontes tardias do judaísmo, em que o humano que penetra o mais secreto lugar sagrado no céu é considerado merecedor de honras angélicas. Embora humanos que ascenderam aos céus são recebidos com hostilidades pelos anjos, ainda sim, conhece-se que os místicos eram adorados pelos anjos. Não é pra menos, que então, aqueles que têm tais visões em Colossos poderiam se orgulhar e assim desqualificar outros que não tiveram tal honra (2.18). Assim, o “falso ensino” em Colossos pode ter dois componentes: O instante preparatório, e as visões deles mesmos, que oferece ao crente a oportunidade de participação de padrões de comportamento que poderia ser imitado diariamente em suas vidas. Isso porque o adepto pode dizer que suas visões são focadas nos comportamentos dos anjos. É nesse ponto que o autor da Carta aos Colossenses vê o problema. Ele não se opõe às visões, ele se opõe às conseqüências dela. Há um foco maior nos anjos do que em Cristo. Por esta razão o escritor paulinista confronta a hipótese de que o padrão de comportamento e de imitação dos anjos é mais importante que se atentar para o exemplo da imagem do Deus invisível, que é o criador dos anjos, porque ele é o único em que são encontrados todos os mistérios (2.3) e de que dele vem o verdadeiro entendimento do que seja humildade (3.12). Ao concentrarem sua atenção na liturgia angélica, os crentes de Colossos estão perdendo a noção de Cristo como o centro de sua fé. Dois outros elementos na epístola proporcionam uma mística interpretação. Além do hino cristológico, a importância de destacar Cristo como o lugar da revelação divina é enfatizada em 2.9. Aqui o autor paulinista fala que em Cristo corporalmente habita toda a plenitude da divindade. O escritor fala de que Cristo apresentou corporalmente a glória divina que habitava nele. Colossenses 2. Oracula 8.13 (2012) 40 10-15 parece indicar que o despojar do corpo carnal na morte de Jesus marcou o momento em que Cristo herdou um glorioso corpo celestial. Evento que colocou Cristo além dos poderes angélicos, um paradigmático evento em que os benefícios podem ser compartilhados pelos cristãos. Em 2.11 a iniciação cristã é contrastada com a circuncisão como um rito que não é feito com as mãos e envolve afastar-se do corpo carnal (note a linguagem de transformação implicada na metáfora de despir-se). O autor da carta pode usar essa linguagem para o batismo cristão, porque o crente é identificado como um que em sua morte colocou de lado o corpo carnal e passou para outro lugar de existência. Assim como Cristo foi enterrado e ressuscitou para uma nova existência no céu, também os crentes ressuscitarão com ele para compartilhar aquela glória no presente (2.12; 3.1). A morte de Jesus marcou o momento em que o tempo do corpo carnal terminou (1.22). De agora em diante, ele é o único que existe como lugar da glória divina em forma corpórea no céu: ele é, então, a imagem do Deus invisível. Ele deixou de lado o corpo carnal e se revestiu de um corpo glorificado que será o último destino dos crentes (cf. Fp 3.21). Os poderes divinos não são compartilhados com um número de seres celestiais exaltados, mas encontrados somente em Cristo, em que estão os segredos de toda a riqueza de sabedoria. O despojamento do corpo carnal em 2.11 é relacionado ao triunfo de Cristo sobre os poderes. Existe também uma dimensão moral para o uso da metáfora que se preocupa em colocar de lado aquela área da vida que não é mais apropriada para as exigências que a nova vida em Cristo traz: em 2.11, é o corpo que deve se afastar das coisas carnais; em 2.15, deve-se afastar-se dos poderes dos principados; e em 3.9, deve-se afastar-se das coisas da velha natureza. Paulo discute a respeito do ensinamento básico (2.8) e rejeita preocupações com tradições humanas em vez da completa revelação divina em Cristo (2.8s.). A correspondência entre circuncisão e carne dá ao escritor um lugar de partida para a sua rejeição das práticas seculares pelos crentes por oponentes e o interesse deles em anjos. Em 2.11, a “verdadeira circuncisão” é um sinal do verdadeiro relacionamento com Deus enraizado na vida ressurreta de Cristo (2.12). Isso envolve “se despir da carne” no sentido de colocar um fim para a subserviência dos valores e práticas do velho eon, por identificação com a morte de Cristo. Esse é o Oracula 8.13 (2012) 41 momento em que ele passou de uma esfera de existência na qual foi submetido a ritos que poderia ser manipulado pelos poderes. Assim como Cristo deixou a esfera da carne em sua morte, também os crentes no batismo passaram da influência dos anjos e é comprometido com um novo padrão de existência (3.1; cf. 3.10). Cristo na cruz apagou a subscrição para velhas ordenanças. Mas o que é na realidade pregado na cruz é nada menos do que o corpo de Jesus (cf. Mc 15.24; Jo 20.27; I Pe 2.24). É o corpo carnal no qual é a esfera de influência dos poderes angelicais e o lugar onde a lei faz a sua exigência. Quando Cristo morreu, ele triunfou sobre os poderes (2.14s; cf. 1 Pedro 3.22) e tira a ligação na qual os poderes angelicais exerciam semelhante domínio sobre a humanidade. O ato de morrer de Cristo o desveste da carne, a ligação de poder segundo quais os poderes angelicais tiranizavam a humanidade. A conquista dos poderes angelicais ocorre no momento do desvestir-se da carne, com aqueles crentes identificados no batismo. Batismo/morte, então, marca um momento de transição do terreno para o celestial, e é nisso que os “santos no mundo” podem gozar nessa era. Nova vida em Cristo qualifica o crente a uma parte da nova vida do céu. Em Colossenses 1.12 a igreja é privilegiada por participar da herança dos crentes na luz. Os santos nesse contexto não são somente os crentes, mas os anjos que são frequentementes descritos desse modo (1QS 19.7s.) Como em Efésios, onde o escritor enfatiza a comunhão da igreja com aqueles do céu em seu serviço evangelical, o crente como um grupo agora desfrutam da herança dos anjos. De acordo com Colossenses 3.1, o alvo dos crentes é o lugar onde Cristo está assentado. Isso é consequência direta do batismo quando a carne é deixada de lado. É a esperança aguardada do crente (Efésios 1.5) e com isso, não é necessário se utilizar de nenhuma prática do mundo de baixo. Assim como Col 3.9 mostra, a transformação não é somente uma transformação mística do adepto, mas uma mudança do ponto de vista moral e prática na qual são marcas distintivas daquele que procura depois um lugar nos céus e estar perto do trono da glória. Esses sentimentos são comparados na evidência de uma orientação ética no apocalipsismo de outro texto de um escrito cristão do primeiro século, o Apocalipse de João (por exemplo, Ap 3.15-21). A promessa de uma participação presente na vida ressurreta em Col 3.1 é um avanço em relação a Rm 6.4ss. Para a comunidade é oferecida uma Oracula 8.13 (2012) 42 oportunidade de ganhar um acesso aos privilégios do mundo acima não através de práticas ascéticas, mas através do focar-se em Cristo. Portanto, a revelação apocalíptica não pode ser uma condição necessária de fé. Quando isso acontece, uma inevitável divisão emerge dentro da comunidade entre aqueles que afirmam ter elaboradas preparações e que são qualificados para receber os mistérios divinos, e o resto da comunidade. Na luz disso, nós podemos considerar o cenário da passagem hínica de Col 1.15. Enquanto elementos de provas têm sido amplamente explorados, passagens como a de Justino, Diálogos 114, onde Cristo é identificado como a divina “kabod” no trono da glória, o único que está na forma do Deus invisível, sugere que Cristo como a imagem do Deus invisível é a expressão concreta de Deus e (tomando as palavras emprestadas do evangelho de João) fazendo o Pai invisível conhecido. Cristo é a manifestação concreta da divina “kabod”, o único “como um homem” que aparece como a imagem do Deus invisível. Cristo dá forma corpórea e expressa a imagem do Deus invisível. Ele é o corpo físico da divindade, a divina “kabod” de Deus revelado. Na carta aos Colossenses, o autor mostra que a plenitude da divindade está em Cristo, que mostra Deus em sua própria forma corpórea (1.15; 2.9). Ele escreve ao leitor tentado a se entregar a práticas ascéticas e esotéricas, que pode ter sido um prelúdio para o pensamento místico dos “tesouros da sabedoria” (2.3). Paulo busca demonstrar a supremacia de Cristo sobre os poderes angelicais, e argumenta que é através da identificação do Cristo transformado e glorificado que há libertação da submissão dos poderes angélicos e do culto que eles controlam (2.14-15). Cristo se sobrepôs a todo ser celeste que governava o kosmos e agora o poder está única e exclusivamente em suas mãos, pois fora constituído viceregente, segundo uma linguagem angelomórfica, também presente na literatura contemporânea ao período em que as deutero-paulinas. A apresentação dessa linguagem angelomórfica, da qual a cristologia bíblica é dependente, é o objetivo de nossos próximos parágrafos. Oracula 8.13 (2012) 43 Quanto à Carta aos Efésios25 e seu contexto, Rowland e Morray-Jones afirmam que é freqüente que se trate Efésios como exemplo para se estudar a segunda geração do cristianismo, quando o fervor escatológico diminuiu e a preocupação com a função da igreja gradualmente assumiu um estágio central. De qualquer maneira, o que é evidente em Efésios é o contraste dualista entre duas eras, em que é substituído por um dualismo cosmológico de “céu e terra, acima e abaixo”. Uma escatologia futura está presente em Ef 1.14; 2.7; 4.10; 5.5; 5.27; 6.8- 13. A ênfase na presente posse que a igreja desfruta é bastante enfatizada. Em Efésios, há seis ocorrências do termo chave “mistério”. Em Efésios, o mistério de Cristo (3.4; cf. Col 4.3) é o desígnio divino (1.10; Cf. Rm 8.29) e a conclusão de tudo em Cristo. Este mistério ficou oculto para as gerações do passado (3.5; Cf Rm 16.25), mas agora é revelado aos santos apóstolos e profetas no Espírito. O conteúdo desse mistério é de que as nações são participantes da herança das promessas de Cristo. O mistério não é nada menos do que o evangelho que é agora revelado para a justiça de Deus (Rm 3.21; 16.25-27). Ao lado dessa ênfase no mistério, em Efésios assim como em Hebreus, aparece um grande movimento apocalíptico, espacial e dualista. Na abertura do segundo capítulo de Efésios, o triunfo de Cristo é enfatizado através da exaltação (Ef 2.21). Na descrição, o escritor usa a frase “nas regiões celestes” que ocorre várias vezes na epístola para descrever o lugar onde Cristo está assentado em glória (1.3; 2.6; 3.10; 6.12). A chave para entendimento da frase é 1.20, onde a dimensão espacial não é duvidada. A atenção do leitor é direcionada para o lugar onde Cristo está entronizado em majestade divina. Em 2.6, o escritor fala de crentes tendo sidos ressuscitados com Cristo e assentado com ele nos lugares celestiais. Isso sugere que na vida da comunidade cristã o escritor acreditou que os crentes que passaram para a luz estão prontos para desfrutar a glória que cerca o trono de Deus. Similarmente em 3.1 a benção que Deus tem concedido aos crentes nos lugares celestiais é em Cristo e os qualifica a participarem na glória que agora pertence ao Cristo ressurreto no céu. Eles agora podem desfrutar aquilo que somente foi manifestado na terra na 25 ROWLAND; MORRAY-JONES, The Mystery of God. Oracula 8.13 (2012) 44 plenitude dos propósitos de Deus (Cl 1.12). As outras duas referências para “nos lugares celestes” trata com um diferente assunto: o relacionamento da igreja com os poderes, terrenos e celestiais. Em Efésios 3.10, o autor fala da sabedoria de Deus feito conhecido pelos poderes por intermédio da igreja. A igreja transforma-se em agente de Cristo no trabalho de salvação. De acordo com Efésios 3.10, o mistério do evangelho é proclamado através da ação da igreja. Ela é unida a Cristo que a qualifica a proclamar os mistérios divinos da salvação. Em Efésios 6.12, o escritor fala da luta de vida ou morte com as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais. Proteção divina é necessária para esse corpo de pessoas. Em Efésios 4.8ss; o autor interpretando o Salmo 68, com sua linguagem de ascensão celestial providencia uma estrutura para a significação teológica do ministério terreno que pode ser afirmado dentro da igreja. Aqui, a especulação da natureza sobre a ascensão transformou-se em parte a um discurso ético no caráter apocalíptico e cósmico da vida de Cristo. O normal e o extraordinário são colocados juntos na vida comum e ações morais, abertas para todos os santos (3.18). Efésios representa uma mudança nas preocupações escatológicas. Em vez de o apocalipsismo ser um meio em que o visionário poderia determinar os segredos do futuro, Efésios representa aqueles escritos no qual a ênfase na presente glória do céu é aplicada. Ideias apocalípticas deixam de ser sobre um deslumbrar futuro, aquilo do que está por vir, para se transformar na participação presente da igreja e para buscar o entendimento dos mistérios que agora são revelados. Linguagem angelomórfica das deutero-paulinas Após termos tratado da experiência mística comunitária expressa nas deutero-paulinas, com base na análise da evolução da metáfora do corpo de Cristo em relação às cartas paulinas tidas como autênticas, passemos agora para a análise das características angelomórficas que Jesus possui nessas cartas. José R. C. Cardoso, em sua tese de doutorado: Cristologia angelomórfica de Hebreus: Estudo sócio-retórico e História das Religiões Comparadas em Hebreus Oracula 8.13 (2012) 45 1.1-14; 2.5-18; 7.1-10, utiliza-se de sete critérios morfológicos para discernir os atributos angelomórficos usados para expressar a vice-regência angelomórfica – readaptando as idéias de Paul Deutsch em The Guardians of Gates. Vale a pena, antes de seguirmos, esclarecer o que o autor dessa tese quis dizer com o termo “angelomórfico”, vejamos, pois, em suas próprias palavras: Cabe dizer que adotamos o termo “angelomórfico” como mais abrangente e mais fielmente descritível que ‚angélico‛, e que mesmo onde aparece algum patriarca transfigurado ou atributo divino, os termos anjo, angélico são entendidos como angelomórficos. Com isto, não queremos dizer que Jesus é um anjo, mas que sua divindade é descrita com elementos angélicos sem comprometer sua humanidade ou divindade. 26 Pois, conforme demonstra em sua tese, existiam textos – como os apócrifos/dêutero-canônicos, pseudepígrafos e os manuscritos do Mar Morto – que apresentavam anjos, figuras hipostáticas e patriarcas exaltados, através de uma linguagem semelhante à que Hebreus apresentou Jesus. Em seguida apresentaremos esses sete critérios, relacionando-os com citações das cartas que são alvo de nossa pesquisa, para que assim seja situada a linguagem angelomórfica que as deutero-paulinas apresentam Jesus. (1) Função Demiúrgica: Atribui-se funções na Criação ao vice-regente angelomórfico. Este participa como agente de Deus na confecção do universo, e em alguns momentos confunde-se com o próprio Criador e por isso é entendido ser pré-existente. A atribuição criadora na Escritura, outrora, exclusiva de Deus, é agora compartilhada com seu agente, evidenciando-se como um mistério revelado no fim dos tempos27. “E demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou por meio de Jesus Cristo” (Ef 3.9) Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele. E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele (Cl 1.16-17). 26 CARDOSO, José Roberto Corrêa. Cristologia angelomórfica de Hebreus: Estudo sócio-retórico e História das Religiões Comparadas em Hebreus 1.1-14; 2.5-18; 7.1-10. São Bernardo do Campo, 2005. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), p. 45. 27 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. Oracula 8.13 (2012) 46 “(2) Guardião do Portal: Cabe ao vice-regente permitir ou não a entrada dos seres humanos e/ou celestiais à presença imediata de Deus”28. Por isso diz: Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, E deu dons aos homens. Ora, isto-ele subiu-que é, senão que também antes tinha descido às partes mais baixas da terra? Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as coisas (Ef 4. 8- 10). 3) Senhorio: O vice-regente angelomórfico exerce governo sobre seres humanos e/ou seres angélicos. As hostes celestiais são designadas a submeterem-se ao seu comando, bem como os seres humanos obedecerem à sua voz como representante de Deus29. Que manifestou em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos, e pondo-o à sua direita nos céus. Acima de todo o principado, e poder, e potestade, e domínio, e de todo o nome que se nomeia, não só neste século, mas também no vindouro. E sujeitou todas as coisas a seus pés, e sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da igreja (Ef 1. 20-22). “Portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus” (Cl 3.1). (4) Juiz: Devido à sua justiça pessoal, o vice-regente é comissionado por Deus para fazer os julgamentos sobre suas criaturas e pronunciar sentenças. O papel de juiz fora exercido na pessoa do rei (Sl 72) e posteriormente na do sumo sacerdote, no período pós-exílico (Zc 3.7)30. Havendo riscado a cédula que era contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era contrária, e a tirou do meio de nós, cravandoa na cruz (Cl 2.14). E a paz de Deus, para a qual também fostes chamados em um corpo, julgue em vossos corações; e sede agradecidos (Cl 3.15). (5) Sacerdote: O vice-regente angelomórfico, devido a sua proximidade de Deus, opera no âmbito do culto divino. Por sua intercessão e mediação os seres humanos têm acesso a Deus. A atividade sacerdotal terrena prefigura a celestial. Daí sua aparência, vestuário, gestos e falar, lembrarem a do sumo sacerdote31. “E andai em amor, como também Cristo vos amou, e se entregou a si mesmo por nós, em oferta e sacrifício a Deus, em cheiro suave” (Ef 5.2). (6) Forma hipostática do homem primordial: O vice-regente angelomórfico encarna o Urmensch, isto é, a humanidade primeva idealizada no Adão pré-lapsariano, ‚a imagem de Deus‛. Sua principal característica é a submissão à divindade, isto é, a obediência, justamente 28 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. 29 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. 30 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. 31 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. Oracula 8.13 (2012) 47 a que faltou em Adão conforme a narrativa bíblica, e, consequentemente, sua pureza de coração32. “O qual é imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação... e ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele” (Cl 1.15 e 17). (7) Ontologia compósita: Este critério atende ao fato de que o viceregente angelomórfico não ser um anjo ou um ser humano apenas. Mas possuir tanto a natureza divina e humana, e ao mesmo tempo ser descrito em termos angelomórficos, ou seja, de mediador glorificado. Essa ontologia compósita pode ser adquirida ou predicada desde o início. Caso seja este, o vice-regente é então pré-existente, caso seja aquela, alcançou a imortalidade33. “Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl 2.9) Estamos conscientes de que este é apenas um esquema, e que todos os esquemas não dão conta de abarcar toda realidade, contudo nesse caso o utilizamos apenas para demonstrar como os temas angelomórficos se apresentam nessas cartas. E pareceu-nos que o aparecimento, às vezes alternado dos temas angelomórficos nas deutero-paulinas, insere essas cartas numa literatura mística mais ampla contemporânea ao seu período. Nessa mesma linguagem angelomórfica Enoc se torna o Metatron: Deus tomou-me do meio da raça do dilúvio e transportou-me nas asas tempestuosas da Schekiná para o céu superior e me trouxe aos grandes palácios na altura do sétimo céu Avarot, onde estão o trono da Schekiná e a Mercabá, as legiões da fúria e os exércitos da ira, os schinamim do fogo, os querubim das tochas flamejantes, os ofanim dos carvões ardentes, os servos das chamas, e os serafim do raio, e Ele colocava-me lá diariamente para servir o trono da glória (III Enoc 7). E ainda inúmeros outros exemplos poderiam ser citados, como o anjo Iahoel do Apocalipse de Abraão; ou o Moisés que se assenta à direita de Deus em Ezequiel Tragicista, dentre outros. O fato é que falar de alguém que fora exaltado à direita de Deus não é novidade nesse ambiente. 32 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. 33 CARDOSO, Cristologia angelomórfica de Hebreus, p. 5. Oracula 8.13 (2012) 48 Dualismo e gnosticismo judaico na cristologia das dêutero-paulinas O último aspecto que pretendemos apresentar da cristologia das deutero-paulinas são seus traços gnósticos, sobretudo, seu dualismo, o qual notamos se manifestando de duas maneiras: através da possibilidade dos crentes sentirem as bênçãos do Cristo exaltado, assim como o Cristo sente as aflições dos fiéis que são seu corpo; e também a repetição do dualismo: “céu e terra”. Primeiramente devemos esclarecer que o gnosticismo que falamos não é aquele movimento histórico intitulado como heresia pelos Pais da Igreja do século II em diante, mas sim o gnosticismo fenomenológico, como o apresentou Hans Jonas em A religião gnóstica34, a partir dessa perspectiva todo movimento estruturalmente parecido com o gnosticismo histórico poderia ser apresentado como tal, por tanto passariam a ser considerados gnósticos alguns movimentos antigos, medievais e contemporâneos, e, particularmente interessante para nós é que o próprio judaísmo teria sua ramificação gnóstica expressa pela literatura de Mercabá. Foi assim que Gershom Scholem apresentou o judaísmo no segundo capítulo de seu já referido livro ali ele afirma entre outras coisas, que a mística do trono representa para o místico judeu o que o pleroma com seus éons, suas potencias e seus arcontes representa para o gnóstico. A ascensão do visionári da Mercabah aparece em Scholem como uma variação judaica da principal preocupação dos gnósticos e dos herméticos dos séculos II e III, isto é, a ascensão da alma a partir da terra através da esfera dos anjos planetários, as esferas do demiurgo e do cosmos, e o retorno à sua luz divina morada na plenitude e na luz de Deus, retorno que para o espírito gnóstico significa a redenção35. Notemos essa estrutura na cristologia das dêutero-paulinas. Primeiramente a possibilidade dos crentes sentirem as bênçãos do Cristo exaltado, assim como o Cristo sente as aflições dos fiéis que são seu corpo, a qual acima afirmamos não serem mais as experiências místicas dos primeiros anos do cristianismo, mas sim uma experiência religiosa fruída pela liturgia institucional que canalizou às antigas energias apocalípticas. 34 Apesar de termos traduzido o título, essa obra não foi traduzida para o português, contamos com a edição espanhola: La religión gnóstica: El mensage del Dios extraño y los comienzos del cristianismo. Madrid: Ediciones Siruela, 2003. 35 GOETSCHEL, Roland. Cabala. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2009 (Coleção Enciclopédia, 780), p. 31. Oracula 8.13 (2012) 49 “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo” (Ef 1.3). “Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo, pela graça sois salvos. E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus” (Ef 2.5-6). E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores. Querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo (Ef 4 11-12). “No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito” (Ef 2.22). “Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja” (Cl 1.24). “E, quando vós estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos todas as ofensas” (Cl 2. 13). “Porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar, então também vós vos manifestareis com ele em glória” (Cl 3.3-4). Quanto ao dualismo céu e Terra: “Do qual toda a família nos céus e na terra toma o nome” (Ef 3.15). “Dando graças ao Pai que nos fez idôneos para participar da herança dos santos na luz” (Cl 1.12). Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo. Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor. E nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade (Ef 1.3-5). Oracula 8.13 (2012) 50 Destaca-se o fato que devido ao crente ser parte do corpo de Cristo, ele goza das bênçãos da glória a qual está no céu, mas é adiantada na liturgia pelo cristianismo institucional. Considerações finais Nesse texto afirmamos que as cartas dêutero-paulinas apresentam uma experiência mística autêntica, embora distinta da experiência dos primeiros cristãos e exemplarmente distinta da experiência paulina, pois o cristianismo, nessa época e lugar, avançava em seu processo de institucionalização. Demonstramos isso através da metáfora do corpo e sua diferença entre as cartas paulinas autenticas e inautênticas, retomando o argumento de Schweitzer, porém sob outra perspectiva. Afirmamos a existência de uma “mística canalizada”, com isso quisemos dizer que ela se distinguia da mística cristã de outros momentos por que agora ela está relacionada com elementos litúrgicos e pela hierarquia eclesiástica, que está muito presente nessas cartas. Interessante notar como Scholem afirma a impossibilidade da unio mystica, no sentido do fiel diluir-se na divindade, mas nada afirma quanto a possibilidade do fiel diluir-se no vice-regente celestial, como foi caso dos cristãos. O fato da canalização dessas energias não impediu que a linguagem apocalíptica continuasse circulando, afinal, ela era a base das afirmativas cristológicas e já haviam sido declaradas as mesmas palavras para diferentes personagens da Bíblia Hebraica, os quais, acreditava-se, terem sido exaltados. Não só a linguagem, mas também a estrutura da Mercabá continuou presente no cristianismo das deutero-paulinas, notamos isso quando as relacionamos com o “gnosticismo judeu”. Oracula 8.13 (2012) 51 Estamos conscientes da polêmica e da obscuridade que se sobrepõe ao cristianismo primitivo, contudo achamos importante em alguns momentos dar vazão a algumas intuições. Em A teologia do apóstolo Paulo de James Dunn, encontramos a afirmativa de que Paulo fundamenta a experiência religiosa dos três maiores ramos do cristianismo ocidental, que são o catolicismo romano, o protestantismo e o pentecostalismo. Cada uma dessas seitas relaciona sua experiência com as três respectivas idéias paulinas: “a mística eclesiástica ou sacramental”, “justificação” e “o recebimento do Espírito Santo”36. As deutero-paulinas seriam a corrente da “mística eclesiástica ou sacramental”, que teriam sua continuidade imediata em Pais da Igreja como Inácio de Antioquia e Clemente de Roma, em sua persistente ordem do “estar em Cristo”, que na verdade significava “estar na Igreja”, Cipriano de Cártago daria continuidade enfática a essa idéia em seu “extra ecllesiam nulla salus”, que se tornaria um dos mais fundamentais dogmas do catolicismo romano. Referências bibliográficas BAKHTIN, Mikhail. Cultura popular na idade média e no renascimento: o contexto de François Rabelais. São Paulo: Hucitec, 2010. BULTMANN, Rudolf. Teologia do Novo Testamento. Santo André: Academia Cristã, 2008. CARDOSO, José Roberto Corrêa. Cristologia angelomórfica de Hebreus: Estudo sócio-retórico e História das Religiões Comparadas em Hebreus 1.1-14; 2.5-18; 7.1- 10. São Bernardo do Campo, 2005. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). DUNN, James. Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo: Paulus, 2008. ELIADE, Mircea. Mito e realidade. 6 ed. São Paulo: Perspectiva, 2006 (Coleção Debates). 36 DUNN, James. Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo: Paulus, 2008, p. 475. Oracula 8.13 (2012) 52 HOORNAERT, Eduardo. Cristãos da terceira geração. Petrópolis/São Paulo: Vozes/Cehila, 1997. GOETSCHEL, Roland. Cabala. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2009 (Coleção Enciclopédia, 780). JONAS, Hans. La religión gnóstica: El mensage del Dios extraño y los comienzos del cristianismo. Madrid: Ediciones Siruela, 2003. JONES, Rufus. Studies in Mystical Religion. London, 1909. MACHADO, Jonas. Paulo, o visionário: visões e revelações extáticas como paradigma da religião paulina. In: NOGUEIRA Paulo A. S. (Org.). Religião de visionários: apocalíptica e misticismo no cristianismo primitivo. São Paulo: Loyola, 2005 (Coleção Bíblica Loyola, 48). _______. O misticismo apocalíptico do apóstolo Paulo: Um novo olhar nas Cartas aos Coríntios na perspectiva da experiência religiosa. São Paulo: Paulus, 2009. NOGUEIRA, Paulo (Org.). Religião de visionários: apocalíptica e misticismo no cristianismo primitivo. São Paulo: Loyola, 2005 (Coleção Bíblica Loyola, 48). OTZEN, Benedikt. O judaísmo na antiguidade: a história política e as correntes religiosas de Alexandre Magno até o imperador Adriano. São Paulo: Paulinas, 2003. ROWLAND, Christopher; MORRAY-JONES, Christopher R. A. The Mystery of God. Early Jewish Mysticism and the New Testament. Leiden: Brill, 2009. SCHWEITZER, Albert. Misticismo de Paulo: o apóstolo. São Paulo: Fonte Editorial, 2006. SCHOLEM, Gershom. As grandes correntes místicas da judaica. 3 ed. São Paulo: Perspectiva, 2008. TILLICH, Paul. História do pensamento cristão. 3 ed.. São Paulo: ASTE, 2004.

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domingo, 3 de abril de 2016

JÉSUS-CHRIST - WIKIPEDIA

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Jésus-Christ

Page d'aide sur l'homonymie Cet article traite de Jésus en tant que Christ pour les chrétiens. Voir Thèse mythiste pour Jésus en tant que mythe, Voir Jésus de Nazareth pour l'aspect historique de Jésus, voir Îsâ pour Jésus en tant que prophète pour les Musulmans.
Jésus-Christ
Image illustrative de l'article Jésus-Christ
Le Christ de la basilique Sainte-Sophie deConstantinople.
Jésus de Nazareth
Naissanceentre 7 et 5 av. J.-C.
BethléemJudée
ou
NazarethGalilée
Décèsvers 301  (33 ans)
JérusalemJudée
Vénéré parchrétiens
Fête25 décembre (Noël)Pâques

Le Christ au globe céleste deJacques Du Brœucq.
Jésus-Christ (prononcé [ʒezykri] ou [ʒezykrist]2), le Christ ou simplement Christ est le nom donné par l'ensemble des chrétiensà Jésus de Nazareth qu'ils considèrent comme le Messie (χριστός / Christos en grec ancien), « l’oint du Seigneur » annoncé par l'Ancien Testament du judaïsme, mort et ressuscité pour le salut des hommes. En effet, les chrétiens reconnaissent Jésus-Christ comme le Messie et le Fils unique de Dieu. De plus, une majorité de ceux-ci le reconnaissent comme l'une des trois personnesdu Dieu trinitaire.

Représentation du Christ en croix, Église de Beaune, France.
Ce n'est qu'à partir des recherches critiques du xixe siècle que les historiens ont peu à peu dissocié Jésus-Christ, la figure religieuse, et Jésus de Nazareth, le personnage historique. De plus, les musulmans reconnaissent Jésus de Nazareth en tant qu'un éminent prophète de Dieu sous le nom d''Īsā.

Le Jésus de l'histoire

Article détaillé : Jésus de Nazareth.
La foi en Jésus-Christ se réfère à l'histoire de Jésus le Nazaréen, hébreu de Galilée, qui apparaît au ier siècle dans le cercle de Jean le Baptiste avant de s'engager, entouré de quelques disciples, dans une carrière de prédication itinérante d'un à deux ans et demi3, essentiellement en Galilée, en pratiquant guérisons et exorcismes. Il suscite engouement et ferveur, s'attirant la méfiance des autorités politiques et religieuses, avant d'être arrêté, condamné et crucifié vers l'an 30 à Jérusalem pendant la fête juive de la Pâque, sous l'administration du préfet Ponce Pilate4.
Dans les premières décennies qui suivent la mort de Jésus de Nazareth vers 30, ses disciples vont se constituer en petites communautés autour de deux croyances : celle que Jésus était le messie attendu par les juifs, et celle qu'il était ressuscité et était apparu à un certain nombre de témoins. Ce « mouvement des disciples de Jésus », par ses croyances en la messianité et la résurrection de Jésus, constitue alors une secte particulière au sein du judaïsme dit du second Temple, beaucoup plus diversifié que ce qu'il deviendra après 70 sous l'impulsion du judaïsme pharisien, qui donnera le judaïsme rabbinique.
La foi en Jésus-Christ est marquée dès ses débuts par la prédication de Paul de Tarse, l'« apôtre des gentils » qui ne connut pas le Jésus historique, mais à qui celui-ci serait apparu après sa résurrection.

Le « Jésus terrestre »

La problématique du « Jésus terrestre » et des traditions qui en relèvent concerne les représentations théologiques du Jésus telles que conservées dans la littérature évangélique. Sans qu'il faille autant opposer symétriquement sur ce sujet recherche et tradition, les recherches sur le Jésus historique — apparues à l'époque moderne uniquement — ne sont accessibles qu'à travers les traditions du « Jésus terrestre »5.
Néanmoins, « la question du Jésus historique s'efforce de discerner à travers les premières traditions sur le Jésus terrestre, les traces qui permettent d'approcher le Jésus de l'histoire. En revanche, interpréter les traditions du Jésus terrestre pour elles-mêmes, c'est rechercher comment les premières communautés chrétiennes ont formulé leur témoignage de foi au Jésus qui a vécu et qui est mort à Jérusalem »6.

Histoire des dogmes chrétiens

Nouveau Testament et les premiers conciles

Les plus anciens textes chrétiens sont les lettres de Paul de Tarse, dont sept sur les quatorze que contient le Nouveau Testament sont considérées aujourd'hui comme authentiques et écrites entre 50 et 55N 1. Jésus y est présenté comme « Seigneur » investi de la puissance et du salut divins. Paul cependant ne discute pas de la nature divine ou humaine de Jésus. L'essentiel de la profession de foi de Paul (on parle aussi de kérygme) est exprimée dans la Première épître aux Corinthiens. Elle repose sur l’affirmation du salut par un rédempteur divin, le Messie envoyé par Dieu pour racheter les péchés des hommes7,8.

Christ pantocrator, mosaïque de labasilique Saint-Apollinaire-le-Neuf àRavenne.
Les trois doigts joints symbolisent la Trinité, les deux doigts levés la double nature humaine et divine9.
Dans les trois évangiles synoptiques, Jésus est désigné indifféremment sous les termes de messie, de Fils de l'homme et de Fils de Dieu. Il s'agit de dénominations juives qui seront réinterprétées par la tradition chrétienne. Le terme de messie désigne dans les prophéties d'Isaïe le serviteur souffrant annonçant le Royaume de Dieu. Le Fils de l'Homme, dans le Livre de Daniel, était la personnification dupeuple élu dans sa pureté initiale exempte de péchés. L'appellation Fils de Dieu, qui sera le fondement de la doctrine de la Trinité chrétienne, était un titre des souverains hellénistiques, et, pour les juifs, celui du messie en tant que roi d'Israël.
L'idée de la divinité de Jésus apparaît clairement à la fin du ier siècle, dans les textes que la tradition chrétienne attribue à l'apôtre Jean(écrits dits johanniques : l'évangile de Jean, qui fait de Jésus le « Verbe de Dieu », les trois Épîtres de Jean et l'Apocalypse), ainsi que dans des lettres attribuées à Paul de Tarse et considérées aujourd'hui comme des pseudépigraphes plus tardifs (épître aux Colossiens etépître aux Éphésiens), qui affirment la préexistence du Christ, « image du Dieu invisible », en faisant l'incarnation de Dieu.
Les différents rédacteurs du dogme d'une orthodoxie qui se construira au fil de différents conciles fondent leurs réflexions sur les textes de l'Ancien Testament et de certains évangiles, présentés dans une articulation cohérente, dont les différentes parties se complètent. Ce sera durant plusieurs siècles l'émergence et l'alternance d'opinions diverses qui se confronteront à travers les différents conciles convoqués par les empereurs romainsN 2 en vue de formuler la foi de l'Église avec une précision de plus en plus rigoureuse.
Les premiers conciles, Nicée en 325 et Constantinople en 381, aboutiront au « Symbole de Nicée », credo qui définit ainsi la croyance orthodoxe en Jésus-Christ :
« Nous croyons en un seul Seigneur, Jésus-Christ, le Fils unique de Dieu, né du Père avant tous les siècles, Lumière issue de la Lumière, vrai Dieu issu du vrai Dieu, engendré et non créé, consubstantiel au Père et par qui tout a été fait ; qui pour nous les hommes et pour notre salut, est descendu des cieux et s'est incarné du Saint-Esprit et de la vierge Marie et s'est fait homme. Il a étécrucifié pour nous sous Ponce-Pilate, il a souffert et il a été mis au tombeau ; il est ressuscité des morts le troisième jour, conformément aux Écritures ; il est monté au Ciel où il siège à la droite du Père. De là, il reviendra dans la gloire pour juger les vivants et les morts, et son règne n'aura pas de fin. »
Ce credo s'opposait en particulier à l'arianisme, qui professait une absence de consubstantialité10 ; mais il rappelait plus généralement ce qui était considéré comme hérésies, par rapport aux différentes conceptions de la divinité du Christ.

La question de la nature de Jésus : homme ou Dieu ?


RaphaëlChrist montant au Calvaire.
Article détaillé : Logos (christianisme).
Souvent, dans les communautés chrétiennes des deux premiers siècles, la croyance en la divinité de Jésus a connu des chemins différents de ceux empruntés par l’Église de Rome, en particulier dans les communautés orientales et encore plus dans celles de l'espace perse.
Certaines (ébionites et elkasaïtes), vont rester attachées à la transcendance du Dieu du judaïsme traditionnel, et à l'humanité de Jésus. D'autres au contraire comme les marcionitesmontanistes vont exalter la divinité de Jésus, et rejeter le corps et la matière. Certaines communautés inspirées par la démarche gnostique suivront la même voie, ce que ne feront pas notamment, les Judéo-chrétiens.
Ignace d'Antioche (35-107) insiste sur la réalité de la vie terrestre de Jésus. Justin de Naplouse (105-135) recourt à la suite de l'Évangile de Jean au terme logos, emprunté à la philosophie grecque, qui signifie la raison divine qui pénètre et gouverne le monde. Origène (185-254) essaie de comprendre comment la nature humaine s'unit à la nature divine en Jésus. Pour lui, Jésus ne peut être vraiment homme sans âme humaine; la nature divine ne pouvait s'unir directement avec le corps.

La thèse d'une nature purement divine

Gnosticisme et manichéisme
Les gnosticismes chrétiens considèrent qu'il existe une nature bonne (divine ou créée par Dieu) et une mauvaise (terrestre, et/ou créée par un démiurge), non miscibles et en conflit. Ils se distinguent en cela du christianisme majoritaire qui estime que Dieu est l'unique créateur, et que tout ce qu'il a créé est d'une nature bonne ; et qu'il n'y a pas de distinction à faire entre une nature divine et une nature charnelle.
Pour les gnostiques, la réalité de l'existence de Jésus parait secondaire par rapport à la signification qu'on lui prête. Il y existe une réflexion profonde sur la personnalité de celui qu'ils nomment le Sauveur qui reste fondamentalement étranger au monde. On retrouve ainsi ce thème : Le Sauveur descend sur terre pour le salut des hommes et à son tour, il assume, pour un temps leur destinée. Non dans le but de donner un sens au monde, à la souffrance ici-bas, mais pour délivrer les parcelles lumineuses qui s'y sont dévoyées11. Parmi ces courants gnostiques, on trouve le docétisme aux iie et iiie siècles qui considère que l'humanité de Jésus n'est qu'une apparence, ce qui implique notamment que la mort sur la croix était une illusion. Sa postérité se retrouvera, plus tard, dans la pensée d'Eutychès (378-453) dont se réclameront plusieurs églises monophysites.
Le manichéisme, considérant que d'une part Dieu et le Bien et d'autre part le Monde et le Mal sont radicalement séparés, ne peut admettre un Jésus qui soit à la fois Dieu et homme. Contre cette séparation, Irénée de Lyon (120-140) affirme que Dieu veut partager sa vie avec l'homme et que par conséquent la nature de l'homme n'est pas opposée mais volontairement adaptée à celle de Dieu et que tout cela est récapitulé en Jésus, Dieu et homme.
Marcionisme
Article détaillé : marcionisme.
Pour Marcion également, Jésus-Christ est la manifestation visible de Dieu avec un corps qui n'est pas fait de chair et de sang, un corps subtil, à travers lequel Dieu, pure transcendance, se manifeste à l'improviste sur le Jourdain. Marcion s'inscrit ainsi dans une radicalisation de la pensée paulinienne, en rupture totale avec le judaïsme, et ne dit mot de tout ce qui a trait à l'enfance de Jésus, de son baptême ou de ses racines juives12. Le marcionisme, issu de la rupture de Marcion en 144 d'avec le presbyterium de Rome, verra des Églises fleurir un peu partout en Orient pendant tout le iiie siècle, prônant une forte exigence morale, l'ascèse et le mépris du corps. Ce sera contre lui que s'élabora la réflexion théologique des Pères de l'Église, le nombre considérable de traités antimarcionniques en témoigne.
Monophysisme
Le monophysisme, apparu au ve siècle dans les écoles théologiques de l'empire byzantin, considère que la nature divine du Christ éclipse de fait sa nature humaine. Contre la reconnaissance de la consubstantialité du Père et du Fils, et de la nature humaine du Christ, les monophysites affirment que le Fils n'a qu'une seule nature et qu'elle est divine, cette dernière ayant absorbé sa nature humaine. Les monophysites s'opposent en cela également au nestorianisme. Le christianisme majoritaire souligne que l'union de ces natures n'a pas supprimé leur différence, et donc que Jésus est véritablement et pleinement un homme. Le monophysisme est encore professé aujourd'hui, dans sa variantemiaphysite. Ce sont les Églises préchalcédoniennes (arméniennesyro-jacobitecopte, etc.).

La thèse d'une nature différente de celle de Dieu : arianisme et unitariens

Article détaillé : Unitarisme (théologie).
L'arianisme est issu des prêches d'Arius à partir de 312. Son point central est la nature de la relation entre Jésus et son Père du ciel et des positions respectives des concepts de « Dieu le père et de son fils Jésus ». L'arianisme, tentant de résoudre le problème entre éternel et contingent, défend la position que la divinité du Très-Haut est supérieure à celle de son fils fait homme. Les ariens adoptent le subordinatianisme, selon lequel Jésus-Christ est créé mais n'est pas de la même substance que Dieu, lequel est incréé et intemporel. Les ariens professent donc une absence de consubstantialité10 : si le Fils témoigne de Dieu, il n'est pas Dieu, si le Fils a une position divine, elle est de moindre importance que celle de Dieu Lui-même. Le christianisme majoritaire soulignera en réponse, dans le Symbole de Nicée, que « Jésus-Christ [est] de même nature que le Père », c'est-à-dire qu'en la personne de Jésus, c'est bien un nouvel aspect de la réalité divine qui a été révélé : que « Dieu se fait homme pour que l'homme se fasse dieu ».

Le baptême du Christ.
Pour l'adoptianisme, Dieu adopte l'homme Jésus comme Fils, seulement lors de son baptême. Cette christologie s'appuie sur une version de Luc 3, 22, présente dans certains manuscrits, qui cite le psaume 2, 7 : « Tu es mon Fils, moi aujourd'hui, je t'ai engendré », au lieu de « Tu es mon Fils bien-aimé ; en toi j'ai mis toute mon affection ».

Une double nature : nestorianisme et vision trinitaire

Article détaillé : Trinité chrétienne.
Le nestorianisme, né au ve siècle de la controverse entre le patriarche de ConstantinopleNestorius et celui d'AlexandrieCyrille, considère qu'il y a eu une superposition en Jésus de deux personnes distinctes, l'une divine et l'autre humaine.
Le christianisme majoritaire souligne qu'il n'y a pas de distinction, que Jésus est à la fois « vrai homme et vrai Dieu », et donc que c'est bien dans le Jésus de Nazareth historique que le christianisme reconnaît le Fils de la Trinité. Le débat au Concile d'Éphèse a porté sur la désignation de Marie, qui n'a pas seulement donné naissance au Jésus historique, mais peut être qualifiée de « Mère de Dieu » ; au titre de cette maternité spirituelle elle est invoquée par les mystiques chrétiens qui veulent que le « Christ soit complètement formé en euxN 3». Le nestorianisme est représenté aujourd'hui au Moyen-Orient dans les Églises des deux conciles.

Dogmes issus des sept conciles

Article détaillé : Concile œcuménique.

Icône représentant le Christ dans une église orthodoxe.
À partir du ive siècle et jusqu'au viiie siècle, sept conciles sont appelés « œcuméniques » parce que tous les évêques y avaient été convoqués, même si peu d'évêques latins ou occidentaux participèrent aux cinq premiers d'entre eux. Tous les conciles œcuméniques n'ont pas la même importance doctrinale. Selon Bernard Sesboüé, le Concile d'Éphèse (que n'acceptent pas certaines Églises, dites desdeux conciles, soit les deux premiers : le Concile de Nicée et le Concile de Constantinople) « est le premier concile à être à l'origine d'une division durable. Il existe aujourd'hui une Église assyrienne de l'Orient13qui a renoncé en 1975 à s'appeler « nestorienne » (...).
On peut résumer, de façon schématique, l'évolution dans la formulation des courants dogmatiques dominants de la manière suivante :
  • étant ce Sauveur qui déifie, le Christ est lui-même Dieu, consubstantiel à Dieu : c'est la définition du Concile de Nicée (325), qui s'oppose à la christologie d'Arius ;
  • il est homme total, consubstantiel à chacun de nous, c'est la définition du Concile de Constantinople (381), qui s'oppose à la christologie d'Apollinaire ;
  • homme et Dieu, il est pourtant être un, et non pas divisé, c'est la définition du Concile d'Éphèse (431), qui s'oppose à la christologie deNestorius ;
  • il reste « deux » tout de même, homme et Dieu, sans confusion ou absorption, c'est la définition du Concile de Chalcédoine (451), s'opposant à la christologie d'Eutychès.
Les catholiques, les orthodoxes des Églises des sept conciles célèbrent Jésus-Christ comme étant à la fois vrai homme et vrai Dieu, deuxième personne de la Trinité.
Pour les christianismes orientaux, la christologie est parfois un peu différente et la situation est assez complexe selon le nombre de conciles que ces Églises reconnaissent :
Toutes ces Églises orientales et l'Église catholique reconnaissent les conciles de Nicée et de Constantinople, et le Credo, ou profession de foi trinitaire, qui en est issu. Les Églises appartenant au Conseil œcuménique des Églises reconnaissent également la Trinité.
Les Églises protestantes européennes le confessent de même, tout en reconnaissant la liberté de conscience à leurs fidèles ; elles présentent donc des conceptions diverses et, même quand la formulation semble identique à celle des christianismes catholique et orthodoxe — qui disposent d’un large corpus dogmatique et d’une structure hiérarchique chargée de le maintenir et de l’enseigner —, il faut tenir compte du fait que le sens donné aux expressions n’exprime pas rigoureusement le même point de vue.
Les unitariens n'acceptent pas le dogme de la Trinité. Ils se réclament d'un monothéisme strict, en ce sens qu'ils ne conçoivent pas de trinité. On trouve des unitariens dans diverses Églises protestantes ou issues du protestantisme : libéralisme théologique du protestantisme libéral et Témoins de Jéhovah. Pour les mormons, par contre, Jésus-Christ est Jéhovah16 et un personnage distinct du Père.

Accord œcuménique

Le patriarche assyrien Mar Denkha IV et Jean-Paul II ont signé une déclaration christologique commune (...) Cette déclaration (...) reprend largement la définition de Chalcédoine(...) il n'y a aucune divergence dans la foi17.» En ce qui concerne les Églises des trois conciles (soit celles qui acceptent les conciles de Nicée, Constantinople et Éphèse, mais pas celui de Chalcédoine), Bernard Sesboüé signale : « En 1973, le pape Paul VI a signé avec le patriarche copte Shenouda une confession de foi christologique qui reprend les termes de Chalcédoine, à l'exception du en deux natures. mais les adverbes, « sans mélange, sans commixtion, sans confusion, sans altération, sans division, sans séparation », sont maintenus et sont même devenus six au lieu de quatre. Or ces adverbes étaient une explication du sens de la formule en deux natures (...) une souplesse dans le langage est redevenue possible, l'accord sur le sens étant clairement acquis. De même le pape Jean-Paul II a signé une confession analogue avec le patriarche syrien d'Antioche18Mar Ignatius Zakka Ier19. » Les quatre premiers conciles, dont les discussions et les conclusions sont centrées sur les deux natures et la personne du Christ et toutes les questions posées à ce propos20, rassemblent un nombre relativement important d'Églises chrétiennes (catholiques, orthodoxes, certaines Églises dites des « deux » ou des « trois conciles », beaucoup d'Églises protestantes certes avec des nuances et non pas toutes). Aucun des quatre premiers conciles ne fera toutefois consensus à son époque et au-delà, et la diversité des courants chrétiens restera très importante21.

Interprétation théologique

Le Messie rédempteur

Articles détaillés : Messie et Christologie de Paul.

Statue du Christ Rédempteur de Rio de Janeiro.
Le Messie (de l'hébreu מָשִׁיחַ — mashia'h) désigne dans le judaïsme l'oint, c'est-à-dire la personne consacrée par le rituel de l'onction, réalisée par un prophète de Dieu. Christ est une traduction littérale de mashia'h utilisée dans la Septante.
La croyance chrétienne en Christ s'écarte cependant de la compréhension du Messie dans le judaïsme.
Elle donne une place centrale à la Résurrection ; Paul de Tarse affirme ainsi dans l'épître aux Corinthiens : « Si Christ n'est pas ressuscité, notre prédication est vide et vide aussi votre foi »N 4.
Le Christ est pour le christianisme le Rédempteur divin, le Messie envoyé par Dieu dont la mort sacrificielle doit racheter les péchés des hommes8.

Le modèle christique selon l'Imitation de Jésus-Christ

Article détaillé : devotio moderna.
Comme fondateur de religion, la figure du Christ fut un modèle pour les chrétiens.
Une œuvre comme L'imitation de Jésus-Christ, recueil d'aphorismes de la fin du xive siècle, alimenta la dévotion et la prière de nombreuses générations de chrétiens, surtout des laïcs, qui cherchaient dans leur vie quotidienne à vivre en respectant les préceptes du Christ (d'où son titre)22. Elle commence par ces mots :
« Celui qui me suit ne marche pas dans les ténèbresN 5”, dit le Seigneur. Ce sont les paroles de Jésus-Christ, par lesquelles il nous exhorte à imiter sa conduite et sa vie, si nous voulons être vraiment éclairés et délivrés de tout aveuglement du cœur. »
L’Imitation eut un succès qui ne se démentit pas pendant des siècles. En 1450, il en existait plus de deux cent cinquante manuscrits. Il était au xixe siècle une référence pour les catholiques et eut une grande influence sur sainte Thérèse de Lisieux22. De nouvelles éditions sortent encore régulièrement.

Réception de Jésus-Christ en-dehors du christianisme

Si pour le christianisme, le Christ est l'unique Messie, d'autres religions, sans le considérer comme tel, le reconnaissent pour un envoyé de Dieu, un prophète ayant comme d'autres avant et après lui reçu une révélation divine.

Islam

Article détaillé : Îsâ.

Mahomet et les prophètes de l'islam, dont AbrahamMoïse et Jésus.
Le Coran raconte, en plusieurs passages, le prodige de la naissance virginale de Jésus, créé par l’impératif divin : « Sois ! »N 6 et conçu par le souffle de DieuN 7.
Dans le Coran, "Le Messie Jésus, fils de Marie, n'est qu'un messager de Dieu, Sa parole qu'Il envoya à Marie, et un souffle venant de lui" (Sourate 4, 171). Annonciateur de Mahomet, il prêche le monothéisme pur, accomplit des miracles, opère des guérisons, ressuscite les morts et « connaît les secrets du cœur ». Ibn Arabi lui confère le titre de « sceau de la sainteté », « le plus grand témoin par le cœur », tandis que Mahomet est le « sceau des prophètes », « le plus grand témoin par la langue23 ».
La représentation de Îsâ dans le Coran lui confère également une dimension eschatologique24 : son retour sur terre, en tant que musulman, est le signe de la fin du monde et du Jugement dernier tandis que beaucoup de hadiths le présentent comme le principal compagnon du Mahdi, Sauveur de la fin des tempsN 8.
On trouve dans le Coran quatre négations catégoriques concernant Îsâ, par crainte d'associationnisme (shirk)23 : il n'est ni Dieu, ni son fils, ni le troisième d'une triade25 — laTrinité étant interprétée par les musulmans comme un signe de polythéisme —, pas plus qu'il n'a été crucifiéN 9 car cela aurait été « indigne » d'un prophète de son importance23,

Représentation de Jésus-Christ dans les arts

Représentation artistique de Jésus-Christ dans l'Antiquité


Sculpture en marbre paléochrétienne du Bon Pasteur, vers 300. Musée du Vatican.
Les auteurs des évangiles, issus d'un contexte judaïque généralement réticent à l'égard des images par peur d'idolâtrie, semblent considérer que les paroles de Jésus sont plus importantes que son apparence et ne donnent aucune description de celui-ci26.
L'art chrétien ne va pas de soi et trouve ses origines dans l'art païen et polythéiste, en l'imaginaire duquel les peintres et sculpteurs antiques puisaient. Les pères de l'Église, pour leur part, contestaient l'art en tant que tel en des termes assez durs et se réclamaient de l'Ancien Testament qui condamne radicalement l'iconographiev 1Clément d'Alexandrie liste néanmoins, vers 200, des éléments qui peuvent endosser une signification chrétienne sur les sceaux ou les bagues, tel le poisson, un symbole chrétien dont le terme grec (ἰχθύς / Ichthus) constituait un acronyme des noms de Jésusn 1.
Si au début du ive siècle le concile d'Elvire interdit encore les images peintes sur les parois des églises, l'art chrétien a cependant déjà pris son essor, dans une visée qui n'est pas étrangère à l'apologétique27.
L'évolution du rapport à la représentation du Christ se transforme dès le premier tiers du iie siècle et une iconographie christique apparaît progressivement dans les catacombes et sur les sarcophages. Les représentations en demeurent cependant rares au profit de figures de l'Ancien Testament, comme Moïse ou Jonas, et Jésus n'est représenté que dans un petit nombre de scènes : son baptême, des miracles ou guérisons, l'entrevue avec la Samaritaine… Son action de thaumaturge est souvent soulignée dans cette première vague iconographique qui le présente également parfois au milieu de ses disciples à l'instar des philosophes grecs26.

Buste de Jésus. Peinture murale dans les catacombes de Commodilla, fin du ive siècle.
Ce Jésus des premières représentations est souvent beau, juvénile, voire séduisant — même si son visage est souvent « passe-partout », ne se différenciant guère de l'iconographie habituelle du panthéon gréco-romain — à contre courant des descriptions des Pères de l'Église qui le présentent comme quelconque, voire laid ou pitoyable26. Il est souvent représenté sous forme du « Bon Pasteur » dans une image qui procède d'un Hermès « criophore »28, à mettre en parallèle avec Orphée, un autre « bon pasteur », image qui va se multiplier sur les premiers sarcophages chrétiens et sur les voûtes des hypogées. Hermas décrit par exemple Jésus au iie siècle comme « un homme à l'air majestueux, en costume de pâtre, couvert d'une peau de chèvre blanche, une besace sur l'épaule et une houlette à la main »29.
Le christianisme devenant progressivement la religion officielle de l'Empire à partir du ive siècle, l'iconographie va petit à petit se libérer du modèle gréco-romain, notamment influencée par les débats christologiques qui caractérisent cette période. C'est dans le dernier tiers du siècle que commence à apparaître la dimension divine — la « puissance cosmique » — du Christ dans les représentations jusqu'alors plutôt marquées par l'aspect protecteur et guérisseur du personnage26.

Christ Pantocrator,vie siècle, église Sainte-Catherine du Sinaïe, Égypte.
À cette époque, Jésus est encore généralement représenté comme un éphèbe glabre ou encore sous la forme d'un petit garçon qui correspond à une dénomination habituelle du Christ à l'époque (« pais », du grec παις, l'« enfant ») ; ce n'est qu'à partir de la fin duive siècle qu'il est représenté plus âgé et barbu, sous l'inspiration du modèle du philosophe enseignant de l'Antiquité. Ces deux types distincts de représentations coexisteront pendant près de deux siècles encore26.
À partir du ve siècle, c'est le caractère divin qui constituera la dimension principale des représentations, appuyant l'insistance du Credo de Nicéesur l'égalité du Père et du Fils et traduisant la structuration par la hiérarchisation et le dogme, dans une image de la « gloire de Dieu » qui dominera l'art chrétien jusqu'à l'art gothique26. L'aspect humain perdurera cependant à travers les icônes, bien que la plupart aient été détruites lors de la crise iconoclasten 2, qui trouveront un prolongement dans l'art byzantin qui fera la synthèse entre les aspects humain — idéalisé en philosophe enseignant — et divin, légitimé depuis le concile de Nicée II en 787.
Les traditionnelles représentations de la Vierge à l'Enfant puisent quant à elles leurs origines dans les représentations de la déesse d'origine égyptienne Isis allaitant Horus30.

Art occidental


Détail du visage du Christ venant de mourir, œuvre de José Miguel Luján Pérez (es), 1793.
L'Église catholique autorisant les représentations du Christ, celui-ci a été l'objet d'un très grand nombre de représentations sous forme de portraits, de tableaux mettant en scène sa vie, de sculptures, de gravures, de vitraux, etc. Dans l'art occidental, le personnage de Jésus est certainement celui qui a fait l'objet du plus grand nombre de représentations. Une des figurations les plus courantes est celle du Christ en croix, au moment de sa Passion.
Toutes ces représentations relèvent de la création artistique, aucune image contemporaine au Christ ne nous étant parvenue. Quelques imagesacheiropoïètes (« non faites de main d'homme ») — dans une christianisation de la tradition païenne des « images tombées du ciel » — représenteraient le « véritable » visage de Jésus.
Malgré la diversité des artistes et des époques, elles ont toutes quelques traits communs. En fait, les représentations de Jésus obéissaient à des canons artistiques précis31, basés sur la tradition et les plus anciennes représentations connues : Jésus est présenté comme un homme de race blanche, de taille moyenne, plutôt mince, au teint mat et aux cheveux bruns, longs ; il sera plus tardivement représenté avec une barbe32.
Sa tête est souvent entourée d'un cercle lumineux ou doré, appelé auréole, attribut courant figurant la sainteté d'un personnage. Quand elle s'applique à Jésus, cette auréole est souvent marquée conventionnellement d'une croix (généralement rouge), qui permet de l'identifier sans ambiguïté.
L'expression des yeux est l'objet d'une attention particulière des artistes. De même, la position de ses mains a souvent une signification religieuse. L'Église catholique ayant exprimé le souhait que la vie de Jésus puisse être comprise par tous, il n'est pas rare de trouver en Afrique des figurations du Christ en homme de race noire, ou en Amérique du Sud des représentations de sa vie avec des vêtements locaux. Ce phénomène est ancien, puisque les artistes de la Renaissance représentaient déjà Jésus entouré de personnages habillés selon la mode de leur siècle (voir le groupe de personnes à droite sur le tableau de Fra AngelicoDescente de Croix).

Fra Angelico, circa 1440 - Descente de Croix.

Scènes de l'enfance de Jésus sur le bas-relief du bas (portail du cloître de lacathédrale Notre-Dame de Paris).
Au Moyen Âge, les représentations visuelles avaient une fonction éducative : en mettant en scène la vie de Jésus-Christ, on diffusait la culture chrétienne à des personnes ne sachant généralement pas lire, et n'ayant de toute façon pas accès aux livres, y compris aux livres saints tels que la Bible[réf. nécessaire]. C'est ce qui est à l'origine de la crèche de Noël, tradition encore très active dans les milieux chrétiens. Certaines scènes sculptées sur les calvaires bretons, comme celui de la chapelle de Tronoën par exemple, sont de véritables résumés de la vie de Jésus. De même, toute église catholique est pourvue d'un chemin de croix (en latin via Crucis) qui figure en 14 étapes, appelées « stations », les différents moments de la Passion du Christ, depuis sa condamnation jusqu'à sa mise au tombeau. Généralement réparties sur les pourtours de la nef, ces étapes sont représentées le plus souvent par des tableaux ou des petites sculptures ; pour les plus simples il s'agit seulement d'une croix accompagnée du numéro de la station. Jusqu'à récemment dans toutes les maisons catholiques, les pièces principales et les chambres étaient pourvues d'un Christ en croix, généralement accroché sur le mur au-dessus du lit ou de l'accès à la pièce.

Art oriental

Les orthodoxes acceptent la représentation du Christ en deux dimensions. La représentation la plus courante est celle des icônes.
Au viiie siècle, sous la poussée des Arabes à l'est et des Bulgares à l'ouest, des mesures seront prises dans l'Empire romain d'Orient contre les images et les statues qui peuplent les églises dans le but d'unifier l'empire derrière le seul chrisme, déclenchant la crise iconoclaste qui durera plus d'un siècle33. Après la fin des guerres iconoclastes, le christianisme oriental donne lieu au développement d'un art spécifique, l'icône, basée sur une grammaire picturale très organisée. Ces images sont sacrées, l'esprit du ou des personnages représentés est censé « habiter » la représentation. L'iconographe — le peintre d'icône — se prépare à la fois par un apprentissage théologique et par une ascèse, le plus souvent le jeûne et la prière.
Les icônes sont anonymes jusqu'au xve siècle.